quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A Proposta de Cristo

Warwick Mota



Seria impossível para nós, mensurarmos a grandeza dos ensinamentos do Mestre Jesus, mas podemos afirmar, que a proposta destes, e nortear o comportamento individual de cada um de nós, proporcionando-nos ensinamentos, que provocam profundas reflexões ensejando orientações, que despertam para o desenvolvimento espiritual.

Para lograr objetivos, a mensagem do Evangelho fundamenta-se, em dois grandes aspectos: A autoridade moral e a autoridade espiritual. A primeira, refere-se, a exemplificação dos ensinamentos através dos atos, a segunda interagente a primeira, além de denotar a grandeza moral do Cristo que transcende aos atos e palavras, faculta a modificação do ser, pelo envolvimento fluídico que provoca a sua superioridade espiritual, promanada não das qualidades de seu corpo, mas do seu Espírito. A exemplo disso nos narra Lucas cap. 19 v. 1 a 10, a passagem de Jesus por Jericó.

"E tendo Jesus entrado em Jericó, ele atravessava a cidade .

Havia um homem chamado Zaqueu, que era rico e chefe dos publicanos. Ele procurava ver quem era Jesus, mas não o conseguia por causa da multidão, pois era de baixa estatura. Correu então à frente e subiu num sincômoro para ver Jesus que iria passar por ali. Quando Jesus chegou ao lugar, levantou os olhos e disse-lhe: "Zaqueu desce depressa pois hoje devo ficar em tua casa". Ele desceu imediatamente e recebeu com alegria. A vista do acontecido todos murmuravam, dizendo: "Foi hospedar-se na casa de um pecador!" Zaqueu, de pé disse ao Senhor: "Senhor, eis que dou a metade de meus bens aos pobres, e se defraudei a alguém, restituo-lhe o quádruplo". Jesus lhe disse: Hoje a salvação entrou nesta casa, porque ele também é um filho de Abraão. Com efeito, o Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava perdido ".

O diálogo que aparentemente manifesta-se como que de caráter simplista, revela grandes ensinamentos que para muitos passam despercebidos, mas que, destaca claramente o ensinamento moral e o ensinamento espiritual. O fato de Zaqueu procurar uma melhor forma de ver Jesus, revela uma predisposição a mudança dos atos, pois a simples presença do Rabi Galileu provocava profundas reflexões. Outro ponto indiscutível, é que a mudança de Zaqueu já fazia parte dos objetivos do Mestre, tanto que ao entrar em Jericó, o percebe facilmente em cima de uma árvore ansioso por um olhar, ao que Jesus corresponde, demonstrando profundos conhecimentos de psicologia transpessoal, levantando o olhar, se dirige a ele dizendo:

"Zaqueu desce depressa pois hoje devo ficar em tua casa", neste momento o vocábulo casa adquire outra conotação, visto que, ele vem antecedido de uma afirmativa verbal, "pois hoje devo ficar em tua casa", na frase, o verbo devo, é aplicado no sentido de certeza e não de hipótese. Entendemos com isso, que o Mestre, se refere a casa mental de Zaqueu, pois a hospedagem que desejava Jesus, não era apenas no lar físico de Zaqueu, mas principalmente no seu coração, a fim de que este se modificasse. Convém ressaltar, a imensa facilidade, com que Jesus manipula os fluidos, pois, subentende-se, que ele altera a psicosfera pessoal de Zaqueu, permitindo, que este, compreenda a mensagem de natureza espiritual na sua perfeita essência, e ele a entende como se Jesus a propusesse: "Desse depressa pois hoje devo ficar em teu coração para sempre".

O envolvimento fluídico na questão é tão patente, que bastou alguns momentos em contato com o Mestre para que se processasse profundas modificações morais em Zaqueu, não apenas pelo compromisso público de restituir quadruplamente (segundo a lei de Moisés), aqueles a quem prejudicou anteriormente, mas por despertar nele, o sentimento de caridade e desprendimento, levando-o a doar aos pobres, metade dos bens que lhe pertenciam.

A autoridade espiritual de Jesus se faz presente, ao afirmar: "A salvação entrou nesta casa, porque ele também é filho de Abraão. Com efeito, o filho do homem veio procurar e salvar o que estava perdido". Não obstante demonstrar claramente o conhecimento da ficha espiritual de cada Espírito encarnado na Terra, visto que, conhecia as mazelas que marcavam o caminho espiritual de Zaqueu, percebia nos seus pensamentos a vontade de mudar. Se não fosse verdade estaria Jesus interferindo no livre arbítrio daquele, modificando-o intimamente contra sua vontade.

A receptividade de Zaqueu as sugestões fluídicas do Mestre, modifica instantaneamente seu comportamento para com Deus, para com o próximo e para consigo mesmo, salvando aquela encarnação e por conseguinte reformando-se pela conversão, através de atos e não de promessas.

É oportuno recordarmos que a passagem de Zaqueu é de grande alcance e importância na condução de nossas atitudes, subir no sincômoro representa a predisposição para a mudança, que funciona como agente facilitador da reforma íntima, reforma esta, que constitui-se no preparo da morada de nossos corações, onde o Cristo com certeza pedirá pousada.

A Reencarnação

Mecanismo de justiça e evolução, a pluralidade das existências constitui uma das leis divinas

Warwick Mota


Indubitavelmente a reencarnação constitui-se em uma das crenças mais antigas da humanidade. Ponto comum a muitas religiões, a idéia da reencarnação é difundida sob as mais diversas formas. Reencarnar significa voltar à carne outra vez, nascer de novo; podemos conceituar então reencarnação, como renascimento.
Se fizermos uma análise desapaixonada do assunto, poderemos observar que a doutrina da reencarnação, é, entre todas as doutrinas filosóficas, aquela que melhor se pode aceitar nas bases de investigação de natureza científica. Já são muitos os cientistas que estudam a problemática reencarnacionista, dentre os quais podemos citar grandes pesquisadores como o Dr. Jan Stevenson da universidade de Virgínia, U.S.A.,o Dr. H. N. Banerjee, da Universidade da Índia, o Dr. Hernani Guimarães de Andrade, do Instituto Brasileiro de Pesquisas Psicobiofísicas, de São Paulo e tantos outros não me­nos importantes, com boas obras publicadas, que destacam o caráter científico deste maravilhoso tema.

Não podemos esquecer que dentro de uma análise religiosa, a reencarnação é a única doutrina que se mostra compatível com a Justiça de Deus. Diante da reencarnação caem por terra as arbitrariedades dogmáticas, as in­justiças, os absurdos teológicos, os problemas psicológicos, as anomalias genéticas, as incongruências de natureza social; todas essas situações encontram uma resposta diretamente proporcional para com a dignidade humana, pois somente uma explicação plausível pode-se encontrar para tais situações: a reencarnação, que por dedução lógica é a resultante da lei de causa e efeito, ou seja, sabemos que o homem tem várias vidas e que cada vida é vivida como efeito das causas de outras vidas; se assim não o fosse, a Justiça Divina seria completamente injusta.

Dentro desse mesmo contexto religioso, vamos encontrar na Bíblia, no antigo testamento, indícios claros de que a reencarnação já era conhecida também pelos israelitas, onde está escrito: “visito a maldade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me aborreceram - Êxodos 20:5”. Podemos entender, em outras palavras, que o sofrimento atual das pessoas é na maioria das vezes uma conseqüência direta dos erros come­tidos no passado, que sensibilizaram as leis naturais; o resultado dessa sensibilização reflete-se diretamente no próprio infrator, que deverá em uma nova existência adequar-se às mesmas leis que infringiu; para isso, volta várias vezes no mesmo círculo familiar.
Sem fugir ainda deste contexto, vamos encontrar aqueles que combatem a reencarnação, afirmando que esta não fazia parte dos ensinamentos do Cristo; esse posicionamento está equivocado, pois ao buscarmos no novo testamento, Mateus 11:14, vemos os discípulos perguntarem ao Cristo: “esse é o Elias que há de vir? “ Ora! Elias tinha morrido há mais de quinhentos anos; essa pergunta seria uma insanidade se os discípulos não conhecessem a reencarnação.

A crença na reencarnação era um conceito tão difundido no oriente próximo e médio que o povo a aceitava como algo perfeitamente normal; essa aceitação está tão explicita, que no caso do homem cego de nascença, os discípulos chegam a ser contundentes. “Rabi, quem pecou, este ou os seus pais, para que nascesse cego? (João 9:1:12)”.

O paralelo entre Elias e João o “Batista”, tão mal compreendido por irmãos de outras crenças, é muito rico em evidências reencarnacionistas; basta querer enxergar. Elias foi um homem de muita importância dentro do seu cenário histórico, visto que teve ele, uma grande ascendência na religião e na política de Israel, entre os anos de 874 a 853 a.C., período em que Achab governou Israel. O ponto alto dessa história começa com o Rei Achab, casando-se com Jezabel, filha do Rei Etibaal da Sidônia.

Na Sidônia prestava-se culto ao deus Baal e Jezabel era uma adoradora desse deus; após seu casamento com Achab, ela entendeu que como rainha de Israel, poderia introduzir naquele país o culto ao deus Baal, o deus pagão de seu país de origem. Tal decisão atingiu em cheio as concepções religiosas dos israelitas e com isso Elias posicionou-se radicalmente contra essa inserção pagã, deflagrando uma guerrilha pessoal contra Jezabel, que resultou em uma morte trágica da mesma, como está descrito em 2º Reis 9:30/37: “Jeú, o general do Rei, a jogou de uma janela de uma torre do palácio e, ao cair seu corpo despedaçou-se, sendo devorado pelos cães; só lhe sobrando as palmas das mãos e a caveira.”
Trezentos anos após a morte de Elias, o profeta Malaquias afirma em uma de suas profecias que Elias iria voltar. “Eis que vos envio o profeta E/ias, antes que venha o dia grande e terrível do Senhor.” Foram quase quinhentos anos para que essa profecia acontecesse, o que veio ocorrer ao tempo de Jesus; Elias reencarnou como João o “Batista”, comprovado pelo Cristo, em Mateus 11:14.

Ao que tudo indica, a querela entre Elias e Jezabel não ficou lá mui­to bem resolvida, pois, Elias, ao retornar como João o “Batista”, reencontra a inimiga do passado, Herodias. E impossível negar, as evidências são irrefutáveis entre os dois episódios, envolvendo Jezabel/Herodias e Elias/João Batista.

Vejamos: ambas casaram-se com Reis de Israel; Jezabel casou-se com Achab e Herodias com Herodes; as duas cometeram o mesmo “pecado”: ofenderam as leis religiosas de Israel, uma tentando introduzir culto ao deus Baal, a outra, cometendo o incesto, ao casar-se como cunhado. A primeira, foi perseguida por Elias e a segunda, por João Batista. Jezabel, que no primeiro episódio desencarnou de forma trágica, como Herodias, desta feita inverteu os papéis, induziu sua filha Salomé a convencer Herodes a ordenar a decapitação de João Batista, cuja cabeça foi entregue a Salomé em uma bandeja.

Muita água rolou e, ao contrário do que muitos pensam, a crença na re­encarnação foi aceita pela igreja cristã primitiva até o ano de 553 d.C, quando foi abolida pelo Quinto Conselho Ecumênico, reunido em Constan­tinopla, por três votos a dois. posteriormente, o reverendo G. Nevin Drinkwater, um sacerdote católico liberal, esclareceu, que o Conselho jamais declarou que a reencarnação fosse herética; o fato é que, em um sínodo local, o Conselho condenou os ensinamentos que foram propostos por Orígenes, em suas obras De principiis e Confra Celsus; entretanto, o reverendo esclarece que a decisão do Concilio foi apenas local, não sendo assim compulsória, para toda a Igreja Universal1.

Alguns estudiosos da Bíblia informam que após o Concílio, os textos do antigo e novo testamento, que referiam-se à reencarnação, foram considerados esotéricos, sendo de­cifráveis apenas pelos iniciados ou pelos que detinham o conhecimento para a interpretação das escrituras; dessa forma a reencarnação foi aos poucos caindo no esquecimento do povo e só nos séc. XII e XIII d.C, foi novamente difundida pelos cátaros (palavra de origem grega que significa “puro”), ou albigenses, devido à cidade de Albi. Além da crença na reencarnação, os cátaros não admitiam qualquer tipo de intermediário entre o homem e Deus; essas crenças afrontavam diretamente os interesses da Igreja e do regime feudal; por isso passaram a ser perseguidos ferozmente pela Igreja Católica, que os considerava hereges.

Apesar das tentativas das teologias tradicionais em abafar a crença na reencarnação ao longo dos séculos, a Providência Divina não nos deixa órfãos de conheci­mento e envia no tempo preciso, missionários como Allan Kardec, que vem revelar para a humanidade carente de conhecimentos coerentes, a doutrina da reencarnação, ensinada pelo espíritos superiores, como um elemento pedagógico dentro do processo de evolução individual das criaturas.

Quando, no desdobramento da questão 330 de “O Livro dos Espíritos”, o Codificador, evoluindo em seu raciocínio acerca da necessidade da reencarnação, pergunta aos Espíritos superiores: “a reencarnação é uma necessidade da vida espírita, como a morte é da vida corpórea?” Ao que os Espíritos lhes respondem sem rebuços: “Certamente, assim o é”.

Antes Que Venha o Arrastão

Mateus, 13:47-50

Richard Simonetti


Ao tempo de Jesus era usado no Mar da Galiléia o arrastão, uma forma de pescaria.

Os pescadores preparavam redes quadradas, bem grandes, que permaneciam numa posição vertical dentro d’água, mediante a utilização de pesos e flutuadores. Eram levadas pelos barcos e deixadas em determinada localização. A partir dali eram puxadas para a praia, por cordas, colhendo todos os tipos de peixes, suficientemente grandes para ficarem presos em suas malhas.

Havia proibições de consumo, pela lei judaica, como está na orientação mosaica, em Levítico (11:12):

Tudo o que não tem barbatanas nem escamas, nas águas, será para vós abominável.

Juntamente com os peixes não comestíveis e de mau sabor, eram jogados de volta ao oceano ou iam para o lixo.


***

Jesus usa a imagem do arrastão para transmitir um de seus ensinamentos sobre o Reino dos Céus.

… é semelhante a uma rede lançada ao mar, que apanha toda espécie de peixes.

Quando está cheia, os pescadores a retiram e, sentados na praia, escolhem os bons para os cestos, e o que não presta deitam fora.

Assim será na consumação dos séculos: virão os anjos e separarão os maus dentre os justos, e os lançarão na fornalha ardente, onde haverá choro e ranger de dentes.

No aspecto individual o Reino é uma condição íntima. Instala-se num momento de iluminação em que nos integramos plenamente na Vida, cidadãos do Universo.

No aspecto coletivo exprime-se numa sociedade formada por Espíritos iluminados.

Com o crescimento espiritual da Humanidade amplia-se o contingente dos que realizaram o Reino em seus corações.

Hoje, uma minoria.

Amanhã – dentro de decênios, séculos ou milênios, depende de nós –, a maioria.

Acontecerá, então, o arrastão.

Colhidos pelas malhas da Justiça, aqueles que não se enquadrarem na nova ordem serão jogados na fornalha ardente…

Naturalmente, trata-se de um simbolismo, uma imagem forte, que a teologia medieval levou ao pé da letra, concebendo a idéia do inferno de fogo, onde as almas comprometidas queimam sem se consumir, em perenes sofrimentos.

O Espiritismo oferece idéia diferente.

Não estarão irremissivelmente condenados.

Serão simplesmente degredados em planetas inferiores, onde enfrentarão dificuldades e dissabores sob orientação da mestra Dor, lá bem mais severa.

Isso, somado às saudades da Terra e dos afeiçoados que aqui ficarão, quebrará a rebeldia, favorecendo sua renovação.

Redimidos, ainda que isso exija o concurso dos milênios, retornarão ao nosso Mundo, porquanto compõem a grande família humana, sob os cuidados de Jesus.


***

Segundo Emmanuel, no livro A Caminho da Luz, há dez mil anos havia no sistema de Capela, estrela da constelação de Cocheiro, um planeta habilitado à promoção.

Deixaria de ser um mundo de expiação e provas, como é a Terra, cujos habitantes são orientados pelo egoísmo, e passaria a mundo de regeneração, com uma população disposta a assumir a cidadania do Reino de Deus.

Ocorre que uma parcela da população não estava sintonizada com os novos rumos. Então, houve o arrastão, envolvendo milhões de recalcitrantes. A direção espiritual do planeta os transferiu para um mundo em evolução primária.

Você pode imaginar qual foi, amigo leitor?

Se pensou na Terra, acertou.

Os capelinos encarnaram no seio das raças humanas, promovendo desde logo grandes transformações, já que mentalmente eram muito mais evoluídos, embora moralmente em estágio semelhante aos terrestres.

Os antropólogos espantam-se com a civilização neolítica. Em algumas centenas de anos grandes conquistas foram obtidas – a domesticação dos animais, a descoberta da agricultura, a formação da escrita, a utilização de metais, a vida urbana…

O Homem, que estava praticamente na idade da pedra, repentinamente viu-se em meio a significativas conquistas.

Foram iniciativas dos capelinos, que deram origem às grandes civilizações, como a egípcia, a chinesa, a hindu e a indo-européia.

Detalhe importante. Não estão bem definidos para os antropólogos os fatores que determinaram sua extinção.

À luz do Espiritismo, é simples explicar.

À medida que os degredados, renovados e redimidos, retornaram ao planeta de origem, as civilizações que edificaram entraram em decadência.

Imaginemos uma família rica e abastada, que construa moderno palacete numa favela. Depois de alguns anos o proprietário muda-se e deixa o imóvel para os favelados. Estes, sem condições para cuidar adequadamente dele, deixam que se deteriore, até transformar-se em ruínas.

Foi o que aconteceu com aquelas civilizações.

Morreram porque o homem terrestre não tinha competência para preservá-las.

***

Algo semelhante ocorrerá conosco, no grande arrastão.

Seitas pentecostais o anunciam para breve, ainda neste século.

Proclamam seus arautos:

– Arrependam-se! Está chegando a hora!

O Espiritismo confirma que isso acontecerá, não como uma condenação eterna, mas como um degredo transitório para aqueles que não aderirem, de coração, ao Reino.

Parece-me, amigo leitor, que não acontecerá em tempo breve. Fácil entender a razão.

No Sermão da Montanha Jesus nos dá uma pista de quem ficará, ao proclamar:

Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a Terra.

Significa que ficarão aqueles que houverem conquistado a mansuetude. Se acontecesse agora, certamente, nosso planeta seria transformado num deserto, porquanto raras pessoas efetuaram essa conquista.

Estamos tão longe da mansidão, em face do caráter agressivo que caracteriza o homem, orientado pelo egoísmo, que o termo manso guarda uma conotação pejorativa.

Chamar alguém de manso é xingá-lo, equivalente a dizer que corre sangue de barata em suas veias.

No entanto, é apenas alguém que venceu a agressividade; que não reage ao mal com o mal; que guarda as raízes de sua estabilidade no próprio íntimo.

Se bem observarmos, verificaremos que muitos males que conturbam as relações humanas, em todos os níveis, inspiram-se na agressividade, sempre com o propósito de favorecer o interesse pessoal.

***

Podemos fazer um teste ligeiro, a verificar se estamos conquistando a mansidão, habilitando-nos ao Reino, ou se corremos perigo no arrastão.

• Submetidos a uma cirurgia, permanecemos acamados por alguns dias.

a) Cultivamos a oração e a serenidade, procurando não incomodar os familiares, nem aumentar sua preocupação.
b) Perturbamos a todos com gemidos e reclamações, como se estivéssemos em leito de faquir, colchão de pregos pontiagudos.

• Um conhecido passa por nós sem nos cumprimentar.

a) Consideramos que não nos viu ou estava distraído.
b) Ficamos possessos: – Pretensioso! Julga que tem um rei na barriga!

• O cônjuge está quieto, fechado, poucas palavras…

a) Imaginamos que esteja cansado, querendo um pouco de sossego.
b) Estressamos e logo clamamos que intenciona nos levar à loucura com seu mutismo.

• No trânsito, um motorista buzina atrás, assim que abre o sinal.

a) Admitimos que deve estar com pressa. Engatamos a primeira e seguimos em frente.
b) Castigamos o atrevido, demorando para avançar. Se torna a buzinar, fazemos um sinal malcriado, convidando-o a passar por cima.

• Cruzamos rua preferencial, inadvertidamente. Um motorista, cujo carro quase foi atingido, faz gesto pejorativo, sugerindo barbeiragem.

a) Admitimos que precisamos estar mais atentos.
b) Gritamos a plenos pulmões, recomendando-lhe que vá procurar aquela senhora de profissão nada recomendável, que o pôs no Mundo.

• O chefe nos adverte quanto a uma falha.

a) Desculpamo-nos, com a disposição de melhorar nosso desempenho.
b) Mal contemos o desejo de pular em seu pescoço, e, intimamente, formulamos ardentes votos de que ele vá para o diabo que o carregue.

• O subordinado comete uma falha.

a) Tratamos de orientá-lo para uma melhor condução do serviço.
b) Lembramos-lhe de que, se não der um jeito na sua atuação profissional, há dezenas de desempregados que podem ocupar seu lugar, fazendo o dobro do que faz, ganhando metade de seu salário.

• Os vizinhos envolvem-se numa discussão, pondo-se a gritar uns com os outros.

a) Consideramos que estão com algum problema e passamos a orar por eles.
b) Chamamos a polícia para dar um jeito naqueles malucos.

• O filho vai mal na escola.

a) Dispomo-nos a acompanhá-lo nas tarefas, ajudando-o.
b) Damos-lhe uma surra, prometendo fazer pior se voltar a ter notas baixas.

• Num grupo de trabalho, em atividade religiosa, não aceitam nossa sugestão.

a) Ficamos tranqüilos, considerando que muitas cabeças pensam melhor que uma só.
b) Reclamamos que é uma cambada de pretensiosos que não deixa espaço para ninguém, e nos afastamos.

Se nossas respostas envolvem em maioria a opção “a”, podemos ficar tranqüilos. Estamos bem em nosso aprendizado espiritual.

Se as respostas mais freqüentes envolvem a opção “b”, há deficiências comprometedoras.

É preciso cuidado, torcendo para que não venha o arrastão antes de vencermos os arrastamentos da agressividade.

O Amor

O Amor, sublime impulso de Deus, é a energia que move os mundos:
Tudo cria, tudo transforma, tudo eleva.
Palpita em todas as criaturas.
Alimenta todas as ações.
O ódio é o Amor que se envenena.
A paixão é o Amor que se incendeia.
O egoísmo é o Amor que se concentra em si mesmo.
O ciúme é o Amor que se dilacera.
A revolta é o Amor que se transvia.
O orgulho é o Amor que enlouquece.
A discórdia é o Amor que divide.
A vaidade é o Amor que ilude.
A avareza é o Amor que se encarcera.
O vício é o Amor que se embrutece.
A crueldade é o Amor que tiraniza.
O fanatismo é o Amor que petrifica.
A fraternidade é o Amor que se expande.
A bondade é o Amor que se desenvolve.
O carinho é o Amor que se enflora.
A dedicação é o Amor que se estende.
O trabalho digno é o Amor que aprimora.
A experiência é o Amor que amadurece.
A renúncia é o Amor que se ilumina.
O sacrifício é o Amor que se santifica.
O Amor é o clima do Universo.
Em suma, o bem é o Amor que se desdobra, em busca da Perfeição no Infinito.

Não Há Mais Tempo a Perder

Não há mais tempo a perder

Não há mais tempo a perder. Estamos todos juntos no mesmo barco e inúmeros indicadores apontam na mesma direção: se não dermos a devida resposta à ameaça que nos espreita, ficaremos marcados na História como a civilização que teve a competência de diagnosticar a maior de todas as tragédias ambientais sem que isso tenha justificado uma ampla mobilização da sociedade. Esta é a razão pela qual muitos estudiosos classificam o aumento do aquecimento global como um problema ético: sabemos que ele existe, nos reconhecemos como agentes do processo e, ainda assim, pouco ou nada fazemos no sentido de enfrentar a situação com a seriedade e o senso de urgência que o assunto requer.

É chegado o momento de reconhecer o inimigo para enfrentá-lo com consciência e determinação. Ele é invisível, não tem cheiro nem faz mal à saúde, mas quando aglomerado aos bilhões de toneladas na atmosfera por conta da queima progressiva de petróleo, gás natural e carvão (as queimadas no Brasil também entram na conta e, no caso específico da Amazônia, a área verde que virou fumaça no ano passado equivale em tamanho a Israel), tem o poder de mudar o clima, o ciclo das chuvas, o nível dos oceanos e a expectativa de vida de inúmeras espécies e ecossistemas. Jamais experimentamos algo parecido numa escala de tempo tão curta.

O dióxido de carbono (CO2) aparece no Tratado de Kyoto como o mais importante gás de efeito estufa, mas para que o acordo internacional saísse do papel foram definidos prazos e metas bastante modestos: uma redução média de 5% nas emissões de gases de efeito estufa dos países desenvolvidos entre 2008 e 2012 em relação às emissões destes mesmos países ocorridas em 1990, quando o mínimo necessário seria de 60% (ou mesmo 80%, como aponta o recém lançado Relatório Stern, assinado pelo ex-Economista Chefe do Banco Mundial). Mesmo reconhecendo que a substituição dos combustíveis fósseis por outras fontes de energia deva acontecer de forma gradual, o ritmo das mudanças é extremamente lento. O mérito de Kyoto é dar início a um processo que, embora já tenha produzido alguns resultados importantes, se arrasta em passo de tartaruga enquanto as mudanças climáticas vêm a galope.

Tão importante quanto o comprometimento dos países em reduzir suas emissões de gases de efeito estufa, principalmente de CO2, são as iniciativas individuais. O que cada um de nós está disposto a fazer nesse sentido? Que pequenas mudanças podemos aplicar em nossa rotina em favor desse objetivo maior? Mudança é uma palavra que assusta, e que muitos de nós associamos de imediato a sacrifício. Nem sempre é assim. Avalie o que lhe convém, considerando que cada tonelada a menos de carbono na atmosfera faz toda a diferença.

Vejamos alguns exemplos do que é possível fazer hoje em benefício de um futuro menos traumático:

1) Transportes: Em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, as maiores emissões de CO2 têm origem nos automóveis. Sempre que possível, deixe o carro na garagem e privilegie o uso de transportes públicos. Estima-se que 80% de nossos deslocamentos diários se resolvam num raio de 5 km de distância, o que abre caminho para o uso de bicicletas ou pequenas caminhadas. Se o uso do carro for inevitável, prefira os modelos flex rodando a álcool, com motores sempre regulados, pneus calibrados e aceleração baixa.

2) Árvores: As espécies vegetais estocam carbono nas raízes, troncos, galhos e folhas. Quanto mais árvores plantarmos, mais carbono estaremos retirando da atmosfera. O inverso é rigorosamente verdadeiro: para cada árvore destruída haverá mais carbono agravando o aquecimento global.

3) Construções inteligentes: Luz e ventilação naturais demandam um consumo menor de energia. Certos materiais usados no revestimento de casas e escritórios também ajudam a conservar a temperatura ambiente de modo agradável, sem a necessidade de ventiladores ou aparelhos de ar-condicionado.

4) Consumo: Um estilo de vida consumista acelera a exaustão dos recursos naturais. Todos os produtos demandam matéria-prima e energia para existir. Quem consome muito além do necessário agrava a pressão sobre os estoques de energia, com reflexos importantes sobre as emissões de CO2. Apesar do que apregoam muitas campanhas publicitárias, é possível ser feliz com menos, bem menos do que aparece nos comerciais.

5) Neutralizando as emissões: A Copa do Mundo da Alemanha foi a primeira da História a neutralizar totalmente as emissões de gases estufa. Com precisão germânica, a organização do evento estimou a quantidade de CO2 emitida pelos 3 milhões de visitantes e investiu em projetos que retiraram da atmosfera a mesma quantidade de gás estufa. Isso já está sendo feito no Brasil e no mundo em shows de música, lançamentos de livros ou CDs. Para muitos empresários, esse é um excelente filão de negócios na direção da responsabilidade social corporativa.

Seria ótimo se a responsabilidade de reduzir as emissões de CO2 fosse apenas dos países. Mas estamos sendo convocados individualmente à ação enquanto consumidores, eleitores e habitantes de um país em desenvolvimento, categoria apontada pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU como bastante vulnerável às turbulências que vêm por aí. Podemos e devemos nos antecipar a isso.
André Trigueiro é jornalista com Pós-graduação em Gestão Ambiental pela COPPE/UFRJ, Professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC/RJ, autor do livro “Mundo Sustentável – Abrindo Espaço na Mídia para um Planeta em transformação” (Editora Globo, 2005), Coordenador Editorial e um dos autores do livro "Meio Ambiente no século XXI", (Editora Sextante, 2003).

Deteriorização do Meio Ambiente Numa Análise Espírita

A DETERIORIZAÇÃO DO MEIO AMBIENTE NUMA ANÁLISE ESPÍRITA
(18.07.10)

A Natureza é sempre o livro divino, onde Deus escreveu a história de sua sabedoria, livro da vida que constitui a escola de progresso espiritual do homem. Todavia, o atual e desenfreado sistema econômico é uma das barreiras que impedem a consciência de sustentabilidade ambiental. Não é preciso ter o dom da profecia, para sabermos o catastrófico cenário no porvir do nosso Planeta.

Estamos na iminência de desastres ecológicos, de consequências imprevisíveis, em face da rota de colisão entre o homem e o meio ambiente. Um relatório de uma comissão da ONU (Organização das Nações Unidas) que estudou as mudanças climáticas, é sombrio: "Até o fim do século, três de cada dez espécies de seres vivos desaparecerão do Planeta, e a vida humana será profundamente afetada"(1).

Estudos indicam que a "mudança climática tem matado cerca de 315 mil pessoas por ano, de fome, de doenças ou de desastres naturais, e o número deve subir para 500 mil, até 2030"(2). O estudo estima que o problema do clima afete 325 milhões de pessoas, anualmente, e que, em duas décadas, esse número irá dobrar, atingindo o equivalente a 10% da população mundial da atualidade.

Os resultados dessa síndrome são alarmantes, como o aquecimento e a alteração do clima, precipitando a ocorrência de furacões, tempestades severas e, até, terremotos; o efeito do "El Niño e La Niña", também é aterrorizante, pois que acelera o degelo das calotas polares, aumentando, consequentemente, o nível do mar e inundando regiões litorâneas. Quase 25% da população mundial estão ameaçados pelas inundações, em consequência do degelo do Ártico. São reais os registros de diminuição das geleiras no Himalaia, nos Andes, no Monte Kilimanjaro, e a única estação de esqui da Bolívia, Chacaltaya, pôs fim à sua atividade, pela escassez de neve naquela região.

Os recursos "renováveis" que se consomem e o impacto sobre o meio ambiente não podem ser relegados a questões de menor importância, principalmente, levando-se em consideração a utilização da água potável. Certamente no futuro a sua posse (água potável) pode ser o motivo mais explícito de confronto bélico planetário.

É urgente que se crie uma mentalidade crítica, que permita estabelecer novos comportamentos com foco na sustentabilidade da vida humana. A sociedade deve formatar novos modelos de convivência, lastreados na fraternidade e no amor à natureza.

A falta de percepção, da interdependência e complementaridade, entre os seres humanos, gera, cada vez mais intensamente, o desequilíbrio da natureza. O cientista Stephen Hawking, no livro "O universo numa casca de noz", comenta que: "Uma borboleta batendo as asas em Tóquio pode causar chuva no Central Park de Nova Iorque"(3). Hawking explica, que "não é o bater das asas, pura e simplesmente, que gerará a chuva, mas a influência deste pequeno movimento sobre outros eventos em outros lugares é que pode levar, por fim, a influenciar o clima"(4).

Ao se desmatar as florestas, modificar cursos de rios, aterrar áreas alagadas e desestabilizar o clima, estamos destroçando as bases de uma rede de segurança ecológica extremamente sensível. "O meio ambiente em que a alma renasceu, muitas vezes constitui a prova expiatória; com poderosas influências sobre a personalidade, destarte, faz-se indispensável que o coração esclarecido coopere na sua transformação para o bem, melhorando e elevando as condições materiais e morais de todos os que vivem na sua zona de influência"(5).

Lamentavelmente ainda amargamos os contrastes de uma suprema tecnologia no campo da informática, das viagens espaciais, dos supersônicos, dos raios laser, ao tempo que ainda temos que conviver com esse desrespeito oficializado ao meio ambiente. Por outro lado, e menos mal nos parece é que a necessidade de destruição da natureza "se enfraquece no homem, à medida que o Espírito sobrepuja a matéria"(6). Realmente a consciência de proteção ambiental cresce com o nosso desenvolvimento intelectual e moral.

Devido a esses estertores de aguda dor provinda da "Mãe-Terra", surgem, em várias partes do mundo, grupos de pessoas fanáticas, que criam seitas e cultos estranhos; abandonam emprego, família, à espera do "juízo final". "Na França há cerca de 200 seitas catastrofistas, com 300 mil adeptos. Nos Estados Unidos, 55 milhões de americanos acham que falta pouco para o mundo acabar"(7).

Os terremotos, os furações, as inundações, as erupções vulcânicas e outras catástrofes naturais são e serão parte inevitável da dinâmica da natureza. Isso não significa dizer que não possamos fazer alguma coisa para nos tornarmos menos vulneráveis. "Aprender com as catástrofes de hoje para fazer frente às ameaças futuras"(8). Somos esclarecidos por Allan Kardec, que os grandes fenômenos da Natureza, aqueles que são considerados uma perturbação dos elementos, não são de causas imprevistas, pois "tudo tem uma razão de ser e nada acontece sem a permissão de Deus"(9).

O Livro dos Espíritos afirma ser "preciso que tudo se destrua para renascer e se regenerar. Porque, o que chamamos destruição não passa de uma transformação, que tem por fim a renovação e melhoria dos seres vivos"(10). Porém, qualquer destruição não pode ocorrer antes do tempo. "Toda destruição antecipada obsta ao desenvolvimento do princípio inteligente."(11)

Os flagelos da natureza podem ter utilidade, do ponto de vista físico, não obstante os males que ocasionam, pois que "muitas vezes mudam as condições de uma região. Mas, o bem que deles resulta só as gerações vindouras o experimentam"(12). A Terra não terá de transformar-se por meio de uma hecatombe que destrua de vez uma geração inteira. Até porque, os preceitos espíritas indicam que a atual geração desaparecerá gradativamente e uma nova lhe sucederá naturalmente, ou seja, uma parte dos espíritos que encarnavam na Terra não mais tornarão a encarnar.

Por mais difíceis que sejam os desafios a enfrentar, por conta da própria incúria humana, dinamizemos a vontade de nos harmonizar com a natureza. Não podemos esquecer que Jesus é o Caminho que nos induz aos iluminados conceitos da Verdade, onde recebemos as gloriosas sementes da sabedoria, que dominarão os séculos vindouros, preparando nossa vida terrena para as culminâncias do amor universal no mais profundo respeito à natureza.

Ante os impactos ambientais recordemos sempre que a mensagem do Cristo é o grande edifício da redenção humana em favor da natureza e da sociedade, que haverá de penetrar em todas as consciências humanas, como um dia penetrou nas consciências de Albert Schweitzer, Vicente de Paulo, da irmã Dulce, de Francisco de Assis, da Madre Teresa de Calcutá, de Chico Xavier e de Mahatma Gandhi.
Jorge Hessen

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Pai Nosso

Vitor Hugo Moreau

"Pai nosso,..."

Já neste início, Jesus lembra claramente dos laços que nos mantém ligados a Divindade. Ao ser interrogado no monte das oliveiras, durante o sermão da montanha sobre a forma certa de se orar. Ora, claro é que Jesus não quis, com isso, criar uma forma ou um modelo para oração que deveria ser seguido com uma cartilha. Prova disso temos quando, o próprio Jesus, aconselha a, quando orarmos, não nos assemelharmos aos hipócritas que se põe de pé e afetadamente oram aos homens e, ainda, para cuidarmos de não tornarmos nossa prece em um multiplicado de palavras que pouco dizem ao coração (1). Jesus, em sua sublime sabedoria e evolução, mostra ao povo da época, ainda muito preso aos ritos e as exteriorizações, que chegar ao Pai por pensamento é simples. Basta haver sinceridade nas palavras e amor ao chamá-lo de Pai.

"...que estás no céu."

Sem a idéia do Deus presente, do Deus interno, as pessoas da época O imaginavam com uma visão antropomórfica, como um ser pontual que, do céu regia as leis do universo. Mais adiante, Jesus quebra esta distância nos aproximando, em sua prece, do Pai.

"Santificado seja o Teu nome."

Jesus não veio destruir a lei. Ao contrário, veio cumpri-la até o último iota(2). Mais uma prova disto notamos neste trecho da sua prece quando fazemos a ligação com o segundo mandamento: "Não pronunciareis em vão o nome do Senhor, vosso Deus"(3). Jesus, cumprindo a lei, glorifica o nome do Senhor em uma expressão de humildade e servidão.

"Venha a nós o Teu reino."

Como mencionado acima, Cristo com estas palavras, aproxima o Reino de Deus do povo. Mostra também que o Reino de Deus, do qual Jesus se proclama Rei, não se trata de uma nação na Terra, como pensavam alguns da época, mas sim do reino dos céus, que simboliza a vida espiritual que é, realmente, a real.

"Seja feita a Tua vontade, assim na Terra como no céu."

Com estas palavras, Jesus rogava: cumpra-se na Terra as Tuas leis. Necessitamos ter a consciência de que nada acontece sem estar de acordo com as leis que regem o universo, que são, como disse Jesus, as vontades de Deus. A reencarnação e a lei de causa e efeito são exemplos muito demonstrativos do que o Mestre chamou de a vontade de Deus. Não se trata de uma vontade fútil, autoritária e mutável. Se trata de um conjunto de leis imutáveis e perfeitas funcionando segundo uma inteligência maior, em sua perfeita justiça e sabedoria. Ao elevar nosso pensamento a Deus, devemos ter a consciência de que tudo que pedirmos será realizado segundo nosso merecimento; cumprindo as lei irrevogáveis, imutáveis e perfeitas do Pai. Logo, segundo a vontade Dele(4).

"O pão nosso de cada dia nos dê hoje."

O pão, como elemento sagrado, representa não só o alimento material mas o alimento espiritual, que podemos entender de várias formas. Assim como o alimento material nutre o organismo com a energia necessária para seu funcionamento, recebemos do Alto o alimento fluídico necessário para mantermos nosso psiquismo equilibrado, para permanecermos com nossos pés firmes no caminho do bem e mantermo-nos perseverantes frente as dificuldades do dia a dia.

"Perdoe as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores."

Com esta frase Jesus reafirma os ensinamentos que passava ao povo: "Quando vos apresentardes para orar, se tiverdes qualquer coisa contra alguém, perdoai-lhe, a fim de que vosso Pai, que está nos céus, também vos perdoe os vossos pecados"(5). Como o povo da época tinha a idéia do Deus punidor e vingativo, atribuíam a Sua ira as conseqüências da lei de causa e efeito. Ensinando os homens a perdoar, Jesus ensina-os também a amenizar os sofrimentos futuros que virão como forma de purgar os erros presentes. Ensinava Ele o caminho do amor, menos penoso que o caminho da dor.

"Não nos deixe cair em tentação, mas sim, livra-nos do mal."

Jesus tinha a consciência de que todo o mal que possa nos acontecer, e uma forma ou de outra é responsabilidade nossa. Desta forma, assim nos ensina como pedir o pão ao Pai, pedir forças para não nos deixarmos envolver pelas vicissitudes do mundo. Em nenhuma parte, durante a prece, Cristo nos exime de responsabilidades ou pede para nos livrarmos delas. Ao contrário, conhecedor destas dificuldades, nos ensina através da prece, do perdão da humildade e da adoração a Deus a mantermo-nos fortes para caminhar para frente e para cima em direção ao Pai nosso.

"Amém."

Física Quântica e Espiritismo II: Comentando Alguns Paradoxos

Alexandre Fontes da Fonseca

Os fenômenos ao nível quântico apresentam características completamente diferentes das que observamos no nosso cotidiano. No entanto, é prematuro crer que eles sejam causados por agentes de ordem divinos ou espirituais.

Na matéria anterior[¹], apresentamos um alerta a respeito de algumas afirmativas envolvendo idéias da Física Quântica e idéias espíritas ou espiritualistas. Pretendemos aqui comentar por que os paradoxos oriundos dos fenômenos quânticos geram a idéia de que Deus ou algo espiritual sejam a causa ou a origem de tais fenômenos. Pretendemos, também, discutir a respeito de uma proposta espiritualista feita pelo professor de Física Quântica, Prof. Dr. Amit Goswami, em seu livro “O Universo Auto-Consciente”[²], para solucionar esses paradoxos. O Prof. Goswami foi um dos convidados internacionais no IV Congresso Nacional da Associação Médico Espírita do Brasil ocorrido em São Paulo, entre os dias 19 e 20 de junho de 2003.

Um dos fenômenos de natureza quântica que desperta exclamação nas pessoas leigas em geral é o chamado Salto Quântico, onde uma partícula “desaparece” da posição (ou estado) em que está e “aparece” em outra posição (ou estado) sem viajar através das posições (ou estados) intermediários entre o ponto (estado) inicial e final. Esse fenômeno sugere o pensamento de que a partícula se desmaterializa na posição inicial e se materializa, em seguida, na posição final. Assim, surge a idéia de se comparar esse fenômeno com o que a Doutrina Espírita descreve como sendo o efeito físico de materialização de objetos. O erro ocorre, primeiramente, porque partículas isoladas não são comparáveis a objetos macroscópicos. Pensar que “a partícula é desmaterializada aqui e materializada ali” é uma forma “clássica” de se pensar, isto é, é uma forma de pensar de acordo com o nosso costume de analisar os movimentos dos objetos macroscópicos. Não existe suficiente informação para concluir se o fenômeno de materialização ou desmaterialização de objetos macroscópicos ocorre da mesma forma como descrito com um salto quântico. Vale lembrar que os mecanismos do salto quântico são ainda uma incógnita para a Ciência.

Outra característica interessante é a chamada dualidade onda-partícula onde um objeto quântico, apresenta características ora de partícula, ora de onda, dependendo de como “olhamos” para ela, isto é, de como o experimento é feito para detectá-la. O aspecto que chama a atenção é o caráter subjetivo do resultado do experimento: ele depende da nossa escolha. Voltaremos a esse ponto adiante.

Existe um postulado da Mecânica Quântica chamado colapso da função de onda. Por função de onda, entende-se uma função matemática associada às propriedades físicas de uma dada partícula ou sistema formado por um conjunto delas. Segundo a Mecância Quântica, o estado de uma partícula, antes de se fazer uma medida, é representado por uma superposição de todas as situações possíveis. Apenas após a medição é que algum dentre os possíveis valores de uma dada grandeza física se manifesta. É dito, então, que a função de onda colapsou para o estado representado pelo valor da grandeza medida. A partir daí, dependendo da propriedade física, se não houverem interferências externas, a partícula se caracterizará por possuir o mesmo valor que foi medido para a tal propriedade. Aqui, como no caso da dualidade onda-partícula, o observador tem um papel decisivo na caracterização das propriedades das partículas.

Um outro fenômeno que foi constatado experimentalmente é o chamado fenômeno de não-localidade. Num arranjo experimental conhecido como “experiência de Einstein-Podolsky-Rosen” verificou-se ser possível o envio de uma informação de modo instantâneo de um ponto a outro do espaço. O salto quântico e o colapso da função de onda seriam, também, exemplos de fenômenos não-locais.

Não é preciso citar outros exemplos para percebermos que esses fenômenos que acontecem com as partículas da matéria são completamente diferentes daquilo que vemos ao nível macroscópico. Esse caráter estranho e misterioso que tais fenômenos apresentam têm levado alguns irmãos nossos do movimento espírita a formularem extrapolações de ordem espiritualista para explicá-los. Apesar da intenção nobre de verificar o acordo entre o Espiritismo e os avanços da Ciência, tais estudos precisam ser feitos com um rigor ainda maior do que aquele que caracteriza um trabalho usual de pesquisa científica, pois a responsabilidade de divulgar uma idéia espírita ligada à Ciência é muito grande. Imagine o leitor o que pensará um cientista ao ler alguma interpretação errada de algum conceito científico. Poderemos afastar o seu interesse no Espiritismo por causa de uma idéia ou colocação errada.

Desejamos comentar algo a respeito do trabalho do Prof. Dr. Amit Goswami que propõe a chamada Filosofia Idealista como solução para os paradoxos que apresentamos anteriormente. Segundo Goswami[²] uma solução seria postular-se a existência de uma consciência maior ou consciência cósmica que seria onipresente (para resolver o problema da não-localidade) e estaria ligada a cada ser humano (para resolver o problema do colapso da função de onda).

Esta proposta é interessante do ponto de vista espiritualista e, ao nosso ver, se constitui na primeira proposta espiritualista mais séria envolvendo questões de ordem científica. Note que utilizamos a palavra espiritualista e não espírita. A razão para isso é que, em nossa análise, apesar da proposta do Prof. Goswami introduzir a existência de uma consciência que poderia ser considerada, em princípio, como o Criador, ela não resolve o problema do Espírito. Segundo a sua proposta, a nossa consciência individual não existiria de forma independente do corpo físico. Isso está em franco desacordo com a Doutrina Espírita que afirma que somos a “individualização do princípio inteligen-te”[³] (questão 79 de O Livro dos Espíritos), e que o princípio inteligente independe da matéria.

Como o Prof. Goswami foi um convidado especial no MEDINESP 2003, é preciso reafirmar o alerta que fizemos na matéria anterior[¹] de modo a orientar o leitor a receber as suas idéias e opiniões com precaução. Faço minhas as palavras do espírito de Erasto (Revista Espírita [4]): é preferível “rejeitar 10 verdades do que aceitar uma só mentira”(grifos nossos).

Aproveitamos, ainda, esta oportunidade para convidar o leitor amigo ao exercício da ponderação quando ler ou ouvir dizer, mesmo dentro do movimento espírita, que disciplinas científicas como a Física, a Química ou a Biologia estão provando as idéias espíritas. Devemos ter cuidado com o material divulgado que leva o adjetivo de espírita. Mesmo as pesquisas mais sérias, como é o caso da proposta do Prof. Goswami, não podem ser tomadas como verdades resolvidas. Seria interessante consultar vários profissionais da área de Física, Química ou Biologia antes de se dar crédito a essa ou aquela proposta ou teoria. Seria de grande importância que os autores e escritores que divulgam trabalhos espíritas nesses campos que publiquem a explicação completa dos mecanismos de suas propostas. Isso nos ajuda a fazer uma análise crítica de cada idéia. Uma afirmativa não tem valor científico só porque está ligada a um tema científico. Mesmo autores que são profissionais em Ciência devem ser questionados já que isso não é garantia de que suas idéias são verdadeiras.

Ainda sobre os paradoxos da Mecânica Quântica, vale lembrar que para a comunidade científica eles ainda não foram completamente pesquisados e esclarecidos. A atitude mais prudente é esperar pelo desenvolvimento dessas pesquisas de modo a termos mais certezas e seguranças sobre o assunto.

Como físico, posso dizer que, apesar de não conhecermos ainda os seus mecanismos mais profundos, os fenômenos descobertos pela Física Moderna não estão em desacordo com os princípios básicos da Doutrina Espírita. E o que considero, particularmente, importantíssimo: eles (os fenômenos da Física Moderna) não sugerem que ela (a Doutrina Espírita) precise ser atualizada.

Física Quântica e Espiritismo I: Um alerta

Alexandre Fontes da Fonseca

Apesar dos fenômenos ao nível quântico revelarem uma realidade muito diferente da que estamos habituados, carecemos ainda de maiores pesquisas antes de afirmar que a Física Quântica está confirmando os princípios espiritualistas.

A Física Quântica tem sido considerada, no meio espírita, como em alguns grupos religiosos, como sendo aquela que vai confirmar a existência de Deus e do espírito. Nesta matéria, temos um ponto de vista mais cuidadoso do que é normalmente apresentado. De fato, os fenômenos ao nível quântico têm feito os cientistas se sentirem incomodados e perplexos já que eles mostram que na realidade os nossos cinco sentidos nos fazem crer numa verdade ilusória. Porém, isso não significa que a Física Quântica esteja admitindo a existência de “algo exterior” ou “além da matéria”, conforme proposto pelas doutrinas espiritualistas. O movimento espírita deve, portanto, ser cuidadoso ao divulgar idéias ligadas aos fenômenos espíritas e àquelas propostas pela Física.

Nesta matéria um importante alerta é feito: afirmativas como “o perispírito causa a flutuação do vácuo quântico”, “a Física Quântica prova a existência de Deus” e “o espaço-tempo negativo representa o mundo espiritual”. Estas afirmativas carecem de credibilidade tanto científica como espírita, porque não foram obtidas conforme critérios científicos e da Doutrina Espírita. Não se sabe como essas conclusões foram obtidas e que passos teóricos e experimentais foram seguidos para obtenção do resultado final. Para que uma afirmativa seja considerada científica, não basta que ela envolva um assunto científico e nem que o autor dessa afirmativa seja cientista. É preciso que seja apresentada uma explicação mais detalhada e doutrinariamente embasada.

Apesar das nobres intenções de nossos irmãos que divulgam essas idéias, elas podem trazer consequências negativas para o movimento espírita. Para entendermos melhor o enfoque do problema, citamos Kardec (ítem VII da Intro-dução de O Livro dos Espíritos[1]): “Na ausência de fatos, a dúvida é a opinião do homem prudente”. Esta é a principal razão pela qual se deve tomar cuidado na divulgação de idéias e teorias espíritas que utilizem conceitos das outras ciências. Como os paradoxos da Física Quântica ainda não foram resolvidos pelos cientistas, é prudente esperarmos pelo desenvolvimento das pesquisas nesta área, de modo que possamos, como espíritas, nos posicionarmos melhor perante elas. Pelo simples fato de que nem todos os resultados experimentais da teoria quântica foram totalmente explicados, não autoriza ninguém a afirmar, por exemplo, que Deus ou o espírito é que estão por trás desses fenômenos. Esta atitude é equivocada, não-científica e, o que é pior, expõe o Espiritismo a críticas desnecessárias, afastando as pessoas que trabalham no meio científico e que conhecem bem o assunto.

Novas descobertas causam enormes revisões nos modelos teóricos existentes, demonstrando a fragilidade e o caráter efêmero das recentes teorias da Física. Recentemente tivemos a oportunidade de comentar a respeito desta fragilidade na Física, devido a uma importante descoberta na Física de partículas, e comparar com a solidez da Doutrina Espírita que passou incólume perante todos os descobrimentos do século XX[2]. Esta solidez se dá justamente porque o Espiritismo é uma doutrina baseada em fatos experimentais[2]1.

Comumente critica-se a comunidade científica por não se interessar pelas questões espiritualistas, no entanto, essa postura é bastante prudente. Imaginem se a Ciência desse crédito a toda teoria espiritualista que diz basear-se na Física Quântica para provar a existência de Deus, do espírito ou qualquer outro princípio. Uma pesquisa rápida na internet mostra que existem grupos e seitas religiosas que se utilizam da Física Quântica para darem respaldo aos mais variados assuntos. É importante saber que a comunidade científica prefere rejeitar tais idéias do que se arriscar com uma que seja completamente equivocada. Não foi isso que Kardec nos orientou com relação a novas questões? O espírito de Erasto nos orienta: “mais vale repelir 10 verdades que admitir uma só mentira, uma só teoria falsa”[4].

Por outro lado, esta afirmação não impede ao leitor de estudar e pesquisar seriamente tais fenômenos. Propostas teóricas serão sempre bem vindas. Porém, é preciso que o pesquisador entenda perfeitamente tanto as informações científicas quanto a Doutrina Espírita. É necessário que cada proposta teórica seja consistente tanto com os fenômenos materiais, quanto com os doutrinários aos quais se referem. Um ponto importantíssimo é que qualquer idéia ou sugestão não comprovadas científicamente deve ser divulgada e declarada como tal e não como uma certeza científica. Isto é importante, pois orienta os futuros leitores quanto ao atual status da pesquisa em determinados assuntos.

Na próxima matéria pretendemos explicar porque alguns fenômenos ao nível quântico geram uma idéia de que algo de origem divina esteja por trás deles. Comentaremos alguns pontos positivos e negativos a respeito da recente proposta espiritualista feita pelo físico Prof. Dr. Amit Goswami para solucionar os paradoxos da Física Quântica.

Lembremos ainda o ceticismo de Allan Kardec com relação às mesas girantes antes de conhecer melhor as causas do fenômeno. Achava ele que se tratava de um frívolo divertimento sem objetivo muito sério. Mas após constatar o fenômeno, buscou interpretá-lo à luz dos conhecimentos científicos da época. E, percebendo que os fatos tinham origem inteligente, Kardec iniciou um longo e paciente trabalho de pesquisa onde, somente após muita observação, estudo e questionamento, publicou sua primeira obra, O Livro dos Espíritos. Caros irmãos de ideal espírita, a ciência se desenvolveu muito desde então, porém, o exemplo do Codificador permanece tão atual quanto o foi em sua época. Sigamos o seu exemplo trabalhando na pesquisa espírita com muita perseverança, paciência, observação, meditação, estudo e, só então, depois de muita análise e muita autocrítica, é que devemos levar a público os frutos de nossa pesquisa. Não é necessário pressa, mas sim que tenhamos cuidado naquilo que estivermos informando. Nada como um pequeno passo após o outro. As gerações futuras agradecerão nossos esforços de hoje.

A Humildade

Raul Franzolin Neto

Não há dúvida alguma de que a característica comportamental do ser humano, a humildade, influi de maneira decisiva nos rumos da vida em sociedade. Desde os tempos mais longínquos de vida na Terra, em que a natureza obrigava o homem a empregar grandes esforços na sua luta pela sobrevivência em um mundo hostil, é de se esperar que a união em harmonia e equilíbrio promova melhores resultados do que a sociedade onde impera a vaidade, o orgulho, o individualismo e a falta de humildade em atos e ações.

Nos dias modernos, com o avanço científico e tecnológico, onde a transformação de bens materiais brutos em componentes imprescindíveis à vida do homem moderno, cada vez mais a competitividade na geração do trabalho pessoal e coletivo torna-se maior e mais forte, sendo o fator humildade o grande diferencial para o sucesso de uma reencarnação produtiva e mais feliz.

Assim, estudarmos a humildade como componente do comportamento humano, visando melhor desempenho da sociedade, é fundamental a fim de promover as reestruturações e adaptações no novo mundo regenerado.

Analisar a humildade do ponto de vista de bens materiais é o mesmo que analisar uma pedra como fator responsável pela morte de uma criatura atirada para tal finalidade. É necessário, portanto, avaliar a humildade como característica intrínseca do indivíduo, herdada desde a criação do Espírito, como centelha componente do amor Divino e sujeita a todas as leis da evolução humana, rumo à perfeição.

É muito comum definir como sinônimo de humildade, a pobreza, ou seja, o homem com deficiência ou ausência de bens materiais os quais não podem promover o conforto de uma vida saudável e tranqüila para ele em nosso planeta. Assim, quanto mais miserável for a pessoa, mais ausente de bens materiais, mais humilde ela seria. Essa análise é absolutamente materialista e improcedente, pois se a característica é intrínseca ao Espírito, ela não pode ser extremamente materialista.

Devemos sim, respeitar todas as formas de crenças e aqueles que se julgam com necessidade de estar entre a miséria para aproximar-se da humildade devem mesmo seguir a ordem natural das coisas. Aliás, muitas dessas pessoas estão de fato no caminho da verdadeira humildade espiritual, levando uma vida de simplicidade, de amor a natureza com desprendimento material. Mas o que é uma vida ligada à matéria e o que é o significado de desprendimento material?

Caso o conceito de humildade signifique a pobreza, a miséria, seria lógico raciocinar de duas, uma. Ou a humildade não significa nada na evolução do homem, ou a pobreza, miséria, riqueza não estão totalmente ou parcialmente ligada a ela. Como já dissemos que a humildade é de fato importantíssima na evolução da humanidade, ela se exterioriza nos atos e ações do espírito e não nas situações de posição social a que ele se encontra no momento.

Evidentemente, como o espírito caminha em evolução eterna no seu aprimoramento pessoal, na sua passagem pela matéria terrestre, os bens materiais não devem ser importantes para a sua evolução espiritual. Cabe ressaltar que o conhecido ditado popular - “a pessoa não leva nada dos bens adquiridos aqui depois da morte” não é correto, pois mantém as atitudes e gostos vivenciados quando reencarnada, após o seu desencarne. Na sua nova jornada, no plano espiritual, continua normalmente a luta em seu aprimoramento pessoal.

A forma e não o fundo é o diferencial importante. Por exemplo, um indivíduo adquire um carro bom, confortável, com boa segurança, necessário a sua atividade de vida e compra com recursos do seu próprio esforço. Para ele, o carro é um meio de vida, assim ele o vê e o usufrui. Outra pessoa, bem mais pobre, adquire um bom carro com a intenção de se sentir melhor do que os outros, mais poderosa, mesmo a duras penas, as aparências são mantidas. Neste caso, o carro satisfaz a sua vaidade, o seu orgulho, nada mais. Onde está o desenvolvimento mais aperfeiçoado da humildade? Certamente não é na posição social em questão. A forma é a visão que se tem do bem, o fundo é a visão que se tem do indivíduo com base na sua posição social. Um homem rico pode ser muito mais humilde que um pobre, pois a condição de riqueza e pobreza é uma condição que deve mesmo ser definida antes da reencarnação, sendo, portanto, temporária.

A verdadeira humildade está no espírito e não na condição reencarnatória. O espírito utiliza de todos os meios possíveis para sua evolução e assim, aliás deve experimentar as mais diversas formas de condições reencarnatórias, passando inclusive pela reencarnação em locais de miséria, pobreza, riqueza, diferentes culturas, raças, credos, na deficiência de meio intelectual, nos meios científicos e acadêmicos, etc. É dessa forma, que ele evolui mais rapidamente passando por muitos caminhos, e principalmente, naquele que mais se despreza, que mais odeia no momento. Nesse ponto, há a total desarmonia espiritual e somente através do sentimento real daquela situação, promove a oportunidade de luz para resgatar o seu equilíbrio pessoal. Por isso, veremos sempre pessoas de grande humildade vivendo momentaneamente entre os meios mais ricos, e certamente, aproveitam essa oportunidade com grande propriedade promovendo a verdadeira caridade, além da material, do seu exemplo de vida em favor do bem comum. Por outro lado, veremos também o inverso, a falta visível de humildade na pobreza, denotando vaidade, orgulho e sem o mínimo interesse pelo seu semelhante.

Numa reencarnação na condição de riqueza, há uma responsabilidade muito maior para a evolução do espírito, pois o meio é muito mais propício a ambição, vaidade, orgulho, etc.

Graças à doutrina espírita temos agora a nossa visão ampliada da humildade, pois observamos o indivíduo como um todo, com sentimentos, atos e ações adquiridos ao longo do tempo, quer no plano espiritual quer no plano terrestre. E tudo se confunde. Não é a simples visão da sua condição reencarnatória atual que deve ser apenas considerada. No plano espiritual, a visão se amplia, e muito.

“Vindo de dentro do ser humano, a humildade é característica daqueles que têm a caridade como meta na evolução do espírito.

Ser humilde não significa ser desprovido de bens materiais, mas ser capaz de aceitar a sua condição na escala evolutiva a que todos estamos sujeitos.

Ser humilde é ser capaz de aprender com pequenos gestos e estar sempre aberto a novos conhecimentos em prol da humanidade.

O maior bem que pode um ser humano almejar é a humildade, pois ela é capaz de construir caminhos que levam à luz, caminhos que permitem o companheirismo sem interesses e egoísmo.

Ser humilde é reconhecer no outro o seu valor. É elevar a auto-estima do amigo e pessoas de jornada evolutiva, através do seu exemplo de vida, sempre fundado na verdade e no bem.

Sede humilde e conseguirás a sabedoria, pois ela é a fonte da inspiração a que todos buscamos nessa jornada.

Estejas sempre atento às atitudes grotescas que destroem a harmonia do seu ambiente no lar, escola, trabalho, etc.

Estejas pronto a ajudar os menos favorecidos que você.

Sejas humilde o suficiente para ensinar aquilo que um dia alguém teve a paciência de transmitir a você. A felicidade depende dessa sua estada.

Quanto mais humilde, mais oportunidade de conhecimento terás e maior será a tua recompensa.

Ajude um amigo e sempre será ajudado quando precisares. Não que esse seja o objetivo da caridade, mas é a lei que rege todo o universo: quanto mais amor for dado, mais amado serás...”

(Mensagem psicografada em reunião familiar)

Muita Paz,

Aborto

Christiano Torchi

“Não matarás”. (Êxodo, 20:13)

Aborto é a interrupção da gravidez, com a conseqüente morte do produto da concepção. Segundo projeções estatísticas, cerca de 10 a 12% de todas as gestações terminam em aborto espontâneo. A legislação penal brasileira considera o aborto voluntário como infração penal, nos seguintes casos: aborto provocado pela gestante; aborto provocado por terceiro, sem o consentimento da gestante; e aborto provocado por terceiro, com o consentimento da gestante.

O aborto voluntário somente é permitido, pela legislação penal brasileira, nos casos de perigo de vida para a gestante e nos casos de estupro. A Doutrina Espírita admite o aborto apenas em uma situação: na hipótese de a gravidez representar perigo para a vida da gestante (LE, 359). No caso do estupro, deve ser preservado o direito do inocente que está para nascer. Se a mãe não desejar o fruto daquele relacionamento espúrio (ilegítimo), que dê a luz à criança e depois a entregue para adoção, se conseguir. Não é raro acontecer que a mãe termine apegando-se amorosamente à criança, a princípio rejeitada, que geralmente se transforma em arrimo (suporte) material e moral da mãe nos dias de sua velhice. Geralmente, o estupro, sendo resultante da lei de causa-e-efeito, representa uma expiação para a mãe e para os familiares, que terão uma grande oportunidade de superar, juntos, as dificuldades e os sofrimentos.

Em 1980, calculava-se que se praticava, no Brasil, cerca de um milhão de abortos por ano. Segundo estimativas de 1991, esse índice teria subido para cerca de cinco milhões de abortos por ano. Note-se que tais dados foram tomados com base no internamento ou morte da gestante. Acredita-se, por isso, que o número de abortos praticados seja muito maior do que se pensa.

Na Europa, o problema assume níveis catastróficos. Todos ou quase todos os países da Europa já aprovaram leis permissivas do aborto, sob a alegação de que a vida começa com o nascimento e não na concepção (fecundação ou união do esperma com o óvulo) e que cabe à mulher dispor sobre o seu próprio corpo.A Itália detém o recorde de crescimento negativo da população. Isso causa problemas econômicos, em face do envelhecimento da maioria aposentada, sem o correspondente crescimento da massa trabalhadora e conseqüente respaldo da contribuição previdenciária, incluindo o consumo e o serviço militar.

Entretanto, nem tudo que é legal é moral. O aborto é um ato de covardia, um assassinato praticado contra uma criatura indefesa. Pior que isso, é um crime contra a Natureza, uma vez que o direito de nascer é de Procedência Divina. Não cabe a criatura alguma a faculdade de obstar esse direito, extinguindo a vida de um ser em formação. A vida é um bem indisponível, da qual somos meros usufrutuários (ver item 7.4.4).

A união do Espírito ao corpo inicia-se no momento da fecundação, mas só se completa por ocasião do nascimento (LE, 344; OQE, p. 197). Portanto, desde o início da gestação, já há um Espírito ligado ao ovo. O abortamento significa a sua expulsão de forma violenta, portanto um crime, pelo qual respondem os que praticam a decisão de efetivá-lo e os que o executam (LE, 357 e 358).

No Velho Testamento, o mandamento da lei moral ainda em vigor preconiza o “não matarás”. Com que direito então vamos condenar um inocente, que tem o mesmo direito à vida que nós encarnados?

O aborto frustra o trabalho de verdadeiras equipes espirituais que se coordenam no esforço abnegado para o êxito do processo reencarnatório.

Às vezes, a criatura a ser abortada pode ser um missionário que deveria reencarnar para cumprir uma tarefa essencial à humanidade, como foi o caso de Bethoven, cujos quatro irmãos mais velhos nasceram todos com problemas sérios de saúde, mas nem por isso sua mãe consentiu com a proposta indecente de aborto do quinto filho, que veio a trazer uma contribuição inestimável para o mundo, no campo da música, que é a linguagem da alma (OP, Feb, p. 174-185). Independente da missão a ser desenvolvida pelo Espírito, uma vez que todo ser tem uma tarefa a cumprir na sociedade, por mais simples que seja (LE, 573), o aborto deve ser evitado.

Mesmo diante da possibilidade de o filho nascer com deformidades físicas, como, por exemplo, no caso da hidrocefalia (presença anormal de líquido no cérebro) e da anencefalia (ausência do cérebro físico), a Doutrina Espírita não recomenda o aborto, que, muitas vezes, é autorizado, inadvertidamente, por magistrados desconhecedores das leis naturais em estudo. Não há acaso no processo reencarnatório, pois as leis divinas obedecem a um planejamento, tendo em vista a reeducação e a felicidade das criaturas. Na maioria das vezes, as deformidades físicas fazem parte do programa expiatório1 do reencarnante. Interromper a gravidez, nestas condições, é impedir o resgate do Espírito e dos próprios pais, que igualmente não sofrem em vão ou imerecidamente.

É muito mais sensato enfrentar a gravidez, em qualquer situação, do que praticar um crime dessa natureza. Além da consciência tranqüila, os pais receberão a ajuda necessária do Criador para cumprir o seu papel (ver item 7.3.4).

Desde que as criaturas se permitem a comunhão sexual, é justo que se submetam ao tributo da responsabilidade do ato livremente praticado.

Várias são as causas do aborto. Excetuada a questão de o nascimento representar perigo à vida da mãe, a raiz do mal estará sempre no egoísmo, no materialismo e na ignorância. Muitas criaturas optam pela prática do aborto por questões de vaidade. Há relatos médicos, informando que certas mulheres pedem o aborto por questões estéticas, outras por questões relacionadas ao prazer sexual, escolha do sexo da criança etc. O preconceito da família e da sociedade contra as mães solteiras, principalmente as jovens inexperientes, também tem contribuído para aumentar as estatísticas do aborto.

É importante o controle da natalidade, mas deve ser feito sem violentar o direito de outrem. É preferível evitar a gravidez por meio de métodos contraceptivos, com acompanhamento médico, do que praticar o aborto, quando uma vida palpita plena de esperança, no seio materno.

Na maioria das vezes, a violência contra o feto gera ódio e revolta, que se estende por longos períodos, conduzindo a processos obsessivos de difícil solução (item 7.3.3).

O aborto criminoso produz na organização perispirítica da mulher, isto é, no perispírito, matriz do corpo físico, grande traumatismo, desequilibrando as funções de determinados centros vitais, principalmente o centro genésico (item 5.3.3.2), afetando os órgãos reprodutores femininos, cujos efeitos podem se fazer sentir em mais de uma encarnação.

Se o Espírito abortado for vingativo, inconformado com a oportunidade que lhe foi subtraída de retornar à vida física, imanta-se aos centros vitais da mãe e tudo faz para subjugá-la à sua vontade, enfraquecendo-lhe as resistências psicofísicas e emocionais, podendo, em alguns casos, levá-la à demência ou ao suicídio.

O jurista Ives Gandra da Silva Martins, em artigo contrário ao aborto, transcreveu trechos de uma sentença proferida pela Suprema Corte dos EUA em 1857, ano em que surgiu na França O Livro dos Espíritos. Sete dos nove magistrados votaram a favor da tese de que o negro não era uma pessoa humana e, como tal, pertencia ao seu “dono”. “Mesmo que possua um coração e um cérebro e seja tido biologicamente como humano - decidiu o Tribunal - um escravo não é pessoa perante a lei”. Por conseguinte, podia-se comprar, vender e matar os escravos, como se fossem coisas. Por volta do século V, a Igreja Católica discutia se a mulher tinha alma ou não.

Atualmente, estes argumentos parecem uma piada de mau gosto. Isso comprova que o desenvolvimento intelectual, tecnológico e econômico, próprio dos países do chamado Primeiro Mundo, nem sempre está de acordo com o avanço moral que se espera de uma nação civilizada (LE, 751) e que as transitórias leis humanas, ao contrário das divinas, são mutáveis e apropriadas a cada época.

Apesar disso, naquele mesmo país (Estados Unidos da América), a Suprema Corte admitiu o aborto, em 22.01.1973, sob alegação de que o feto não era pessoa e como tal detentora de direitos, o que demonstra o desconhecimento das leis espirituais que regem a vida humana.

O ginecologista norte-americano Dr. E. Nathanson, ex-diretor da maior clínica abortista do mundo, que praticou, pessoalmente, cerca de 5.000 abortos e supervisionou outros 60.000, felizmente, reconheceu o seu lamentável engano, confessando, inclusive, os métodos desleais e criminosos com que eram manipuladas e fraudadas as pesquisas, nos Estados Unidos, para o efeito de sensibilizar a opinião pública e o Congresso, para obter a aprovação de leis abortivas.

Esse arrependimento se deu depois que ele se especializou em fetologia e pôde constatar, cientificamente, que o feto é uma criatura humana e não apenas um amontoado de carne. Com o desenvolvimento da Medicina, pela ecografia2, foi possível realizar a filmagem do comportamento do feto, no momento da prática abortiva.

Graciela Fernández Raineri, no livreto “Deixem-me viver”3, com base nas experiências narradas pelo Dr. Nathanson, descreveu a reação de um ser indefeso e encurralado no útero materno, no momento do aborto:

“Vi o filme médico ‘O Grito Do Silêncio’, apresentado pelo doutor E. Nathanson, famoso médico ex-abortista norte-americano. Ele mostra, mediante uma ecografia realizada na mãe no momento do abortar, o que sucede com esse ser que - apenas agora se sabe com certeza científica - já tem todas as características próprias da vida humana: capacidade sensitiva à dor, ao medo e apego à vida. Ao vê-lo, acreditei ser uma obrigação social divulgá-lo, porque todos (sobretudo as mães) têm o direito de saber o que realmente sucede em um aborto.

Em instantes prévios à operação abortiva, se vê o feto (neste caso verídico, de doze semanas) com movimentos calmos, colocando o polegar na boca de vez em quando, totalmente tranqüilo nesse ambiente de paz, como é o claustro materno. Ao introduzir o abortista no útero o primeiro elemento metálico procurando a bolsa amniótica para seu rompimento, o novo ser perde seu estado de tranqüilidade. Seu coração se acelera enquanto tenta movimentos nervosos de mudança de lugar. A bolsa é rota e se introduz o instrumento de aspiração. É notório que nenhum dos elementos metálicos tocou ainda no feto e, no entanto, ele pressente algo anormal e terrível próximo a lhe suceder, porque agora muda de lugar em um ritmo enlouquecido para os lados e para cima, em um desesperado intento de escapar. Seu ritmo cardíaco se eleva mais ainda. Quando o metal já está quase a tocá-lo, encolhe todo o seu corpinho até o limite superior do útero e sua boca se abre desmesuradamente. Aqui é alcançado pela aspiradora, que desde suas extremidades inferiores o vai succionando e até o destroçando, até ficar somente a cabeça, que não passa pelo conduto de aspiração. Esta é triturada, então, com uma espécie de tenaz que vai retirando os pedaços do que foi um ser humano aterrorizado, que ainda mesmo sob tamanha desigualdade de condições, fez o impossível para não morrer e, no instante final, abrindo sua boca ao máximo, como um último intento de expressão humana - ainda desconhecida e prematura, porém sem dúvidas com o instinto de sua natureza -, de pedir auxílio... a quem?

Eu, pessoa humana, que ascendi à maravilhosa realidade da vida e posso gritar e expressar minha vontade, empresto hoje minha voz a todos esses seres humanos que, ao serem abortados, quiseram gritar solicitando a vida, abrindo sua boca, porém... ainda não tinham voz! Não é um atitude pessoal subjetiva. Investiguem vocês. É científica e humanamente real. Em nome de todos esses inocentes, eu peço a quem competir que projete este filme nos últimos anos secundários de todos os colégios de mulheres e homens, nas universidades etc., a fim de que se faça conhecer por todos os meios isto que faz a própria essência da pessoa humana; seu inalienável direito à vida”. (Destacamos).

Atualmente, as técnicas modernas permitem inclusive o tratamento das enfermidades do feto no interior do útero, o que acentua ainda mais o direito à preservação da vida, a partir da fecundação.

Aquelas criaturas que já praticaram o aborto ou foram por ele responsáveis não devem se traumatizar ante estas notícias. O grau de culpabilidade é maior ou menor, de acordo com a consciência do ato. Não que possamos invocar o desconhecimento das leis divinas para nos eximirmos de nossas responsabilidades, pois nesses casos o rigor das Leis divinas é atenuado. Não! Mas, o arrependimento sincero e a vontade poderosa de reparar o erro permite à criatura reabilitar-se ante as Leis Divinas, porque Deus é, acima de tudo, Misericórdia, Bondade e Justiça infinitas.

O primeiro passo é arrepender-se sinceramente do que fez, para não mais reincidir no mesmo erro; depois, procurar fazer o bem da forma como puder, como, por exemplo, auxiliando outras crianças, através da adoção direta ou indireta,4 ou por qualquer outro meio lícito.

Enfim, praticar a Caridade como quiser e puder, porque “o amor cobre a multidão de pecados” (I, PEDRO, 4:8), isto é, o bem praticado hoje neutraliza os efeitos do mal cometido ontem.

Nota sobre o Artigo e seu Autor: O artigo acima está no livro ainda não publicado, o qual é também de autoria de Christiano Torchi, advogado e dedicado trabalhador da causa espírita em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, o qual tem como título (ainda provisório) Introdução ao Conhecimento da Doutrina Espírita.

sábado, 9 de outubro de 2010

O Que é Ser Espírita?

Orson Peter Carrara

Se consultarmos o dicionário ele nos indicará tratar-se de pessoa vinculada ao Espiritismo. Se perguntarmos a quem não é espírita, uns ironizam (dizendo por exemplo que os espíritas "mexem" com os mortos), outros temem, outros permanecem indiferentes. Se indagarmos aos próprios espíritas, uns dirão que é ir ao Centro, tomar passe, ouvir ou fazer palestras, ler livros. Outros dirão que é fazer caridade. As respostas serão várias, mas todas incompletas. O melhor então é buscarmos nos livros da própria Codificação, a partir de O Livro dos Espíritos.

Em O Livro dos Espíritos, na conclusão (item VII), o Codificador apresenta uma classificação dos adeptos:

1. Os que acreditam;
2. Os que acreditam e admiram a moral espírita; e
3. Os que crêem, admiram e praticam. Segundo Kardec, esses últimos são os verdadeiros espíritas, ou os espíritas cristãos.

No livro O Céu e o Inferno, que apresenta coletânea de inúmeras comunicações de espíritos nas mais diversas condições, há uma manifestação interessante de espírito que se encontra classificado como Espírito feliz, fruto de uma conduta digna quando na Terra. Trata-se do espírito identificado pelo nome de Jean Reynaud. Indagado se na vida física ele professava o Espiritismo, respondeu: "Há uma grande diferença entre professar e praticar. Muita gente professa uma Doutrina, mas não pratica. Pois bem, eu praticava e não professava."

Professar significa reconhecer publicamente, declarar-se adepto, dizer de si mesmo, fazer propaganda da idéia. Pois bem, aí está a chave da questão. A situação de felicidade do Espírito devia-se à vivência dos princípios do Espiritismo, mesmo sem conhecê-lo.

Breve consulta ao capítulo XVII de O Evangelho Segundo o Espiritismo no item O Homem de Bem e Os bons espíritas, faz compreender que as características coincidem com os preceitos morais que justificam a denominação de espíritas cristãos, conforme definição do próprio Codificador, pois aí surge a figura do espírita praticante.

A questão pode ser fechada com trecho do Espírito Simeão, constante do capítulo X - do mesmo livro citado no parágrafo anterior -, item 14. No último parágrafo, diz o Espírito: "(...) Se vós vos dizeis espíritas, sede-o pois; olvidai o mal que se vos pôde fazer e não penseis senão uma coisa: o bem que podeis realizar. (...)".

Ora, o trecho transcrito bem indica o programa de vivência espírita. Para colocá-lo em prática, há que se esforçar para vencer as más tendências e ainda ocupar-se de fazer o bem. Eis o que é verdadeiramente ser espírita: a adoção dos preceitos morais como diretrizes da própria conduta ou o esforço para a eles se adaptar. O ser espírita é mais uma questão de foro íntimo, que de aparências externas.
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domingo, 3 de outubro de 2010

Antes de Crer é preciso Compreender

Amílcar de Chiaro Filho


Ser espírita é uma questão de livre opção, por isso, estão equivocados aqueles que pensam que estamos atrás de adeptos. Aliás, Allan Kardec afirmou que para ser espírita, antes de crer, é preciso compreender. Compreender o quê? O que é o Espiritismo, do que se ocupa, qual a sua finalidade.

Através do estudo da Doutrina Espírita, que está contida essencialmente na obra Kardequiana, O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Evangelho Segundo o Espiritismo, O Céu e o Inferno, A Gênese, Obras Póstumas, O Que é o Espiritismo e outros opúsculos, aprendemos que a Doutrina Espírita trata essencialmente de:

a. Existência de Deus como Pai soberanamente justo e bom, inteligência suprema, causa primeira de todas as coisas.

b. Existência e imortalidade da alma e seu destino. Trata, também, da sua preexistência.

c. Comunicabilidade entre vivos e mortos, ou numa linguagem espírita, encarnados e desencarnados, através da mediunidade, ponte feita com um material que se chama amor, por onde transitam nossos amados que viajaram antes, ou aqueles que nos odeiam, para exercer perseguições.

d. A reencarnação, que é sempre progressiva e na humanidade. A finalidade da reencarnação não é a de quitar erros do passado, e sim, a de levar o espírito a perfeição, destinação superior que lhe foi dada pelo criador.

O Espiritismo é cristão, e a sua moral é a evangélica, porque é a melhor que existe. Entretanto é preciso compreender que ele está acima dos dogmas, e aberto a todas as filosofias e religiões, porque Jesus de Nazaré não pertence a uma seita ou a um povo, é um missionário sem pátria, sem sectarismo.

O objetivo essencial do Espiritismo é o de melhorar o homem moral e intelectualmente, para que o homem melhore o mundo. Embora o Espiritismo ensine ao homem que a sua verdadeira pátria é a espiritual, ele não se preocupa em levar o homem para o céu, e sim, fazer da Terra um mundo melhor, de paz, harmonia, justiça.

Viver com dignidade é uma das nossas lutas, e para viver com dignidade o homem deve ter o suficiente, como uma casa onde construa um lar. É preciso ter alimentos, roupas, escola em todos os níveis, assistência médica e dentária, emprego, lazer.

Aprendemos, ainda, com o Espiritismo, que a prece é um ato de adoração a Deus. Ela não muda as leis do universo, mas dá forças, coragem, ânimo e fé. Através da prece ligamo-nos com Deus, e criamos um ambiente de fraternidade e de união com os nossos entes queridos desencarnados.

Queremos deixar bem claro que o Espiritismo não admite a mediunidade profissional. Daí de graça o que de graça recebeste, é o lema orientador do Espiritismo, pois ninguém pode arbitrar um preço ao trabalho dos espíritos, e nem obrigá-los a se manifestarem.

Está aí, em linhas gerais, que precisam ser aprofundadas, as finalidades do Espiritismo. Reiteramos nossa argumentação de abertura: O Espiritismo aconselha, que, antes de crer, é preciso compreender

Jesus

Carlos Antonio Fragoso Guimarães


A Mensagem do Cristo

Em dezembro de 1945, alguns felás (beduínos egípcios) deslocavam-se com seus camelos por perto de um rochedo chamado Jabal al-Tarif, que margeia o rio Nilo, no Alto Egito, não muito longe da moderna cidade de Nag Hammadi. Eles estavam procurando um tipo de fertilizante natural na área, chamado sabaque.

No sopé do Jabal al-Tarif começaram a cavar em torno de uma pedra que caíra no talude, e, sem esperarem, encontraram um jarro de armazenagem com um recipiente selado na parte superior. Um dos felás, chamado Muhammad Ali Samman, quebrou o jarro com uma picareta na esperança de encontrar algo valioso, talvez um pequeno tesouro. Deve ter ficado um tanto quanto decepcionado ao ver que ao invés de ouro ou algum tipo de objeto de igual valor, no jarro só havia fragmentos de papiros.

Muhammad Ali Samman, sem querer ou se dar conta, havia descoberto treze livros de papiro (códices), a que hoje chamamos de a biblioteca copta de Nag Hammadi, dois anos antes de outra descoberta famosa, a dos Manuscritos do Mar Morto, conjunto de documentos encontrados na Palestina e que haviam pertencido a uma comunidade judaica que professavam uma forma ascética diferente de judaísmo, conhecido como essênios. Porém, apesar destes últimos manuscritos terem tido maior divulgação, serem mais famosos e terem sido alvos de debates, os primeiros possuem, todavia, caráter muito mais revolucionário, em especial por estarem ligados diretamente ao cristianismo.

Além de outras obras valiosas, entre estes papiros estava algo muito interessante: o chamado Evangelho de Tomé, que é uma coletânea de sentenças de Jesus que teriam sido compiladas, segundo a primeira frase deste Evangelho, por Judas Tomé, O Gêmeo.

Antes desta descoberta excepcional, os estudiosos dos evangelhos já tinham algumas referências dos pais da Igreja referentes a um documento denominado Evangelho de Tomé (ou de Tomás). Porém, o conteúdo deste documento punha em xeque alguns posicionamentos dogmáticos da Igreja. Cirilo de Jerusalém, em suas Catequeses 6.31 afirmava que o Tomé que escreveu este Evangelho não era um seguidor de Jesus, mas um maniqueu - um maniqueísta, portanto, seguidor gnóstico e místico de Mani, mestre herético do século III. Só que, atualmente, é quase consenso de que o texto de Nag Hammadi foi bem escrito antes do movimento maniqueísta ter vindo à lume e, ainda mais, tudo indica que a cópia copta deste evangelho se baseia em um texto ainda mais antigo, provavelmente escrito em grego e/ou aramaico, a língua falada por Cristo. Além dos testemunhos dos chamados padres da Igreja, temos fragmentos de três papiros gregos - encontrados num monte de lixo em Oxirronco, atual Behnesa, no Egito -, publicados em 1897, e que contêm sentenças de Jesus quase idênticas aos encontrados no Evangelho de Tomé de Nag Hammadi, escrito em língua copta. Estes fragmentos de papiros eram, portanto, representantes ou cópias de edições em grego do Evangelho de Tomé.

Ao contrário dos outros evangelhos conhecidos, quer sejam canônicos ou apócrifos, o Evangelho de Tomé não expõe em nada narrativas sobre a vida de Jesus de Nazaré, mas atém-se especificamente às sentenças que teriam sido proferidas por Jesus a seus discípulos. Entre elas, destaco as que se seguem:

Jesus disse: "Se seus líderes vos dizem: 'Vejam, o Reino está no céu', então saibam que os pássaros do céu os precederão, pois já vivem no céu. Se lhes disserem: 'Está no mar, então o peixe os precederá pelo mesmo motivo. Antes, descubram que o Reino está dentro de vocês, e também fora de vocês. Apenas quando vocês se conhecerem, poderão ser conhecidos, e então compreenderão que todos vocês são filhos do Pai vivo. Mas se vocês não se conhecerem a si mesmos, então vocês vivem na pobreza e são a pobreza".


Evangelho de Tomé, logion 3.

Perguntaram-lhe os discípulos: "Quando virá o Reino?" Jesus respondeu: "Não é pelo fato de alguém estar à sua espera que o verá chegar. Nem será possível dizer: Está ali, ou está aqui. O Reino do Pai está espalhado por toda a terra e os homens não o vêem".


Evangelho de Tomé, logion 113

Jesus disse: "Eu sou como a luz que está sobre todos. Eu sou o Todo: o Todo saiu de mim e o Todo retornou a mim. Rachem um pedaço de madeira: lá estou eu; levantem a pedra e me encontrarão ali".


Evangelho de Tomé, logion 77.

Passagens semelhantes a estas, ao menos no conteúdo que expressam, podem ser encontradas nos Evangelhos Canônicos, ou seja, nos Evangelhos reconhecidos pela Igreja, apesar do grande número de manipulações, enxertos e cortes pelos quais estes textos reconhecidamente passaram para se adaptar aos interesses que a Igreja, como instituição, passou a compor desde que Constantino a reconheceu como Instituição Oficial. Podemos encontrar exemplos, como em Lucas 19,20, e que expressam a idéia de Reino de Deus não como um evento ou local espacial ou temporalmente determinado, mas uma conquista do espírito ou mesmo uma tomada de consciência de que, sem que se perceba, o Reino já existe dentro do homem, não sendo extrinsecamente necessário a presença de intermediários institucionais, ou doutores teológicos, que se arvorem na presunção de fazer a ligação entre Deus e o homem, ou a dizer onde está a entrada para um exo-Paraíso que as Igrejas fizeram cada vez mais longe do homem:

Havendo-lhe perguntado os fariseus quando chegaria o Reino de Deus, lhes respondeu Jesus: "- O Reino de Deus vem sem se deixar sentir. E não dirão: '- Vede-o aqui ou ali, porque o Reino de Deus já está dentro de vós' "

É notável a semelhança entre o conteúdo destas sentença de Jesus com a máxima adotada por Sócrates, e que foi emprestada do pórtico do Templo de Apolo, em Delfos: "Homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás o universo". De igual forma, outro grande mestre do espírito humano, Buda, dizia que só o conhecimento de si levava à iluminação, do mesmo modo que Láo-Tsé dizia que apenas o conhecimento da ordem dentro de si levava à compreensão do Tao, do aspecto transcendente que a tudo engloba e vivifica. Da mesma forma, os órficos falavam do processo evolutivo como uma tomada de consciência de que somos deuses por sermos filhos de Deus. Apenas não temos nem a percepção, nem a consciência disto.

Segundo Stephen Mitchell, cujo livro "O Evangelho Segundo Jesus" recomendo, quando Jesus falava do Reino de Deus, ele de fato não estava dizendo ou profetizando um evento que acontecerá de repente e nem uma perfeição fácil e livre de perigos, como interpretaram ao seu bel-prazer alguns doutores da teologia, ou como ainda o fazem alguns líderes de religiões institucionalizadas, retirando a ênfase no presente e pondo-a num futuro sempre mais ou menos distante. Ele estava falando de um estado de espírito que, ao se fazer presente, muda o modo como o homem se comporta com seu semelhante, como fica bem demonstrado em muitas de suas parábolas, como, por exemplo, a da mulher que perde uma moeda e revira a casa inteira em sua busca e, quando a acha, sai a correr chamando os vizinhos e dizendo: alegrem-se comigo, pois achei a moeda que havia perdido. Ela encontrou algo aparentemente muito simples, algo que sempre esteve bem perto dela...

Este estado de espírito pode ser tão simples e poético quanto a revoada de pássaros no céu ou os lírios no campo. Ele não está fora, mas fora e dentro de nós. Tudo está ligado a tudo. O homem é um ser que depende da natureza e de outros homens para sobreviver. Tudo é um e temos de passar por várias etapas para adquirir a consciência disto:"Na casa de meu Pai há muitas moradas". Enfim, o Reino é o reconhecimento no coração de que todos somos filhos de um mesmo Pai, portanto, irmãos e irmãs, cada um refletindo o próprio Deus, portanto, a maior alegria é conviver com Deus que se reflete na presença do irmão. Jesus demonstrava isso na prática de várias formas, em especial durante as refeições, já que ele fazia questão de unir na mesma mesa tanto os sábios e Doutores da Lei, quanto gente simples, publicanos, pecadores e pessoas socialmente consideradas impuras.

Todos nascemos, porém com grau variável de pessoa para pessoa, com um pouco da percepção feliz deste Reino e a mantemos enquanto a cultura - o meio - não ajuda o retirar de nós a natural tendência à afetividade, corrompendo-nos. "Se vos fizerdes como uma criança, entrarás no Reino dos Céus". Os que se envolvem em demasia com as preocupações materiais têm certa dificuldade em entrar neste estado de espírito, pois são possuídos por suas posses que exigem um esforço considerável para serem mantidas e estão tão encarcerados em seus poderes e em sua fantasia social, que, para eles, é quase impossível desapegarem-se delas e terem a liberdade de SEREM longe do peso de demonstrar APARENTAR O TER.

"Não que seja fácil para qualquer um de nós." Escreve Stephen Mitchell. "Mas, se precisarmos avivar a memória, sempre poderemos nos sentar ao pé de nossas criancinhas. Elas, como ainda não desenvolveram uma noção muito firme do passado e do futuro, sabem aceitar de peito aberto e com plena confiança a infinita abundância do presente". Para elas, o tempo corre de forma diferente que para o adulto.

Nossa realidade é moldada pelas nossas crenças. Normalmente vemos aquilo que esperamos ver e outras coisas escapam simplesmente ao nosso olhar por não levarmos outras possibilidades em consideração. Se tememos ao relógio, se nos apegamos ao passado e se nos apavoramos com o futuro, nunca poderemos viver o presente. De certa forma, entrar no Reino de Deus significa sentir que existe algo que cuida de nós a cada instante, da mesma forma como alimenta as aves do céu e veste os lírios do campo, com infinito amor. Algo que Jesus chamava de Abba - Papai. Um pai bem diferente do patriarcal e vingativo Deus dos Exércitos do Antigo Testamento, ainda muito presente em algumas das igrejas cristãs atuais. Talvez Abba seja uma maneira carinhosa de Jesus de se referir a um Deus Pai-Mãe... "Qual de vós, se vosso filho vos pedir pão, lhe dará uma serpente, ou um escorpião se vos pedir peixe? Pois se vós, que sois imperfeitos sabeis o que dar de bom para vossos filhos, quanto mas vosso Pai, que está nos céus!"

Todos os Mestres da humanidade, em todas as épocas e lugares, sempre apontaram para a necessidade de voltarmos a viver o presente como única realidade concreta da alma no mundo: "Não vos preocupeis com o dia de amanhã, pois a cada dia basta a sua própria preocupação....", disse Jesus.

As passagens do Evangelho em que Jesus fala de um Reino dos Céus no futuro não podem ser autênticas transcrições do pensamento do Cristo, e sim interpretações de pessoas ainda muito ligadas ao pensamento judaico da época, a não ser, como fala Stephen Mitchell, que Jesus tivesse dupla personalidade, como se fossem torneiras de água quente e fria. O problema é que Jesus usava uma linguagem figurada freqüentemente composta por imagens fortes, mais propícias a impressionar a mente simples do povo igualmente simples que o ouvia, fazendo-os refletir seus atos de cada dia. Estas palavras, contudo, podiam ser interpretadas de modo tão diferente quanto o número de ouvidos que as ouviam.

O que chegou à nós, em formas de textos evangélicos, não são mais do que interpretações sobre os dizeres do Cristo feito por discípulos. Algumas passagens são tão opostas à doce doutrina de amor e compreensão de Jesus que dificilmente não nos deixam de chocar. Estas estão muito impregnadas de um espírito de vingança e de uma agressividade apocalíptica de mesmo aspecto como encontrado nos textos dos profetas do Antigo Testamento, e cabem muito bem aos judeus que vivenciaram os terríveis acontecimentos da Revolta Judaica do ano 66 d. C. que terminaria com a destruição de Jerusalém pelos romanos e com a dispersão dos judeus por todo o mundo. Cristo desejava mudanças sociais sim, mas a partir da mudança íntima das pessoas que encontrasse a intuição em si de que são filhos de Deus e, portanto, que todas as demais criaturas são irmãos e irmãs que merecem respeito. Estas passagens de um reino externo por vir, muito provavelmente, poderiam ter sido inseridas no Evangelho por discípulos que interpretaram os acontecimentos como um início da materialização do Reino que Jesus pregava, sem atinarem que este Reino é de uma profundidade maior do eles pensavam. Eles viveram estes acontecimentos e tentaram ver neles uma concretização da mudança social que Jesus aspirava a implantar na Terra, ou ainda, por interpretações feitas por discípulos de discípulos. Já que Jesus não deixou nada escrito, tudo o que dele sabemos é de segunda ou terceira mão, sendo o primeiro evangelho sinótico, o de Marcos, sido escrito provavelmente por volta do ano 60, ainda que baseado - segundo experts - em um texto anterior, chamado de quelle - fonte, em alemão, e que muitos pensam estar contido em grande parte no Evangelho de Tomé. Fora isso, a distância ajudou a acomodar os ensinos de Cristo ao que viviam seus seguidores (veja a Home Page O Cristianismo depois de Jesus).

Estes discípulos ainda estavam cheios da tradição judaica. Passagens que falam do Reino de Deus como algo que virá no futuro existem aos borbotões nos profetas e nos escritos apocalípticos judaicos redigidos sob o jugo romano dos primeiros séculos de nossa era, bem como na maioria dos textos geralmente muito patriarcais atribuídos a Paulo pela Igreja primitiva. Elas são repletas de uma esperança passional, exclusivista, e, como apontou Nietzsche, de um amargurado ressentimento contra "eles" (os poderosos políticos e econômicos, os ímpios). Mas tudo isso é fruto de uma interpretação intelectual e passional das reformas sociais propostas por Jesus, que, em toda a sua vida, aboliu todo tipo de distinção de castas e de origens, devido à sua consciência de irmandade entre todos. Os discípulos dos discípulos tiveram uma noção apenas intelectual disto e não da vivência do estado de espírito ou da consciência cósmica vivenciada por Jesus. Uma vivência que foi plenamente vivida por um Francisco de Assis ou por um Mahatman Gandhi, e que é profundamente revolucionária.

Stephen Mitchell fala, com muita propriedade, que o Reino de Deus "não é algo que irá acontecer, porque não é algo que, temporalmente falando, possa acontecer. Não pode surgir num mundo" como se fosse uma invasão externa - "O meu Reino não é deste mundo" - "é uma condição que não tem plural, mas apenas infinitos singulares. Jesus falava das pessoas 'entrando' no Reino, e que as crianças já estavam nele (...). Se pararmos de olhar para frente e para trás, foi o que ele nos disse, poderemos nos dedicar a buscar o Reino que está bem debaixo de nosso pés, bem diante de nosso nariz; e, quando o encontrarmos, alimentos, roupas e outras coisas necessárias também nos serão dados, tal como o são às aves e aos lírios. (...) Este reino é como um tesouro enterrado num campo que é nossa alma; é como uma pérola de grande valor; é como voltar para casa. Quando o encontramos, a nós mesmos, tornamo-nos donos de uma riqueza infinita (...)", é por isto que todos os místicos falam em perderem-se em Deus. "Eu e o Pai somo um", pois nossa personalidade é apenas uma máscara mutável, mas o self, como diria Jung, é a parte mais próxima do divino, em nós. Vivenciando o Deus que há em nós, poderemos reconhecer o Deus que há no outro e, assim, poderemos viver, naturalmente, devido à nosso grau de consciência, a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade.

O verdadeiro Jesus é o Jesus do Sermão da Montanha, o Jesus entre as crianças, o Jesus que admitia mulheres, publicanos e leprosos entre seus seguidores, um homem que se esvaziou dos desejos mundanos comuns, esvaziou-se de doutrinas e regras - todos os inúteis aparatos intelectuais - e se deixou preencher pela vida, como o demonstram as suas parábolas, onde o reino é o campo, é a festa de núpcias, é a rede lançada ao mar... Porque se desapegou de tudo o que é egóico e passou a sentir o TODO - o Tao, como diria Lao-Tsé -, ele deixou de ser meramente alguém, para ser também todos, todo o mundo: "Tudo isso que fizeres a um destes pequeninos, fareis a mim". Porque admitiu Deus em si, sua personalidade é como um ímã que atrai a todos. Quanto mais se aproximam dele, mais sentem a pureza de seu coração. Um coração que é como um quarto claro e espaçoso: "Vinde a mim todos vós que estais aflitos e sobrecarregados, e eu vos aliviarei". As pessoas ou as possibilidades abrem a porta e entram. O quarto recebe a todas o tempo que quiserem, sem impor regras além da do amor. É bem diferente de um coração cheio de pertences, de crenças e de certezas, cujo dono senta-se atrás da porta trancada com uma arma em punho, como o fazem as Igrejas de todas as denominações.

Jesus também reconhecia as verdades espirituais que foram ditas pelos outros Grandes Mestres da humanidade, em todas as épocas. É assim que se explica as grandes similaridades entre seus ensinamentos e os de Buda, por exemplo, que nasceu mais de 500 anos antes de Cristo.

Jesus enfatizava a importância da evolução e da transformação pessoal: "Não te maravilhes de eu ter dito: Necessário vos é nascer de novo (João, 3. 3-7)". Reconhecia a imortalidade da alma: "De fato, Elias há de vir e restabelecer todas as coisas. Eu porém vos digo: Elias já veio e fizeram dele o que quiseram! E os discípulos compreenderam que era de João Batista de quem ele falava" (Mateus, 17, 11-13; Marcos, 9, 11-13). Bem, como Elias não voltou numa carruagem celeste ao tempo de Jesus, e como "os discípulos compreenderam que era de João Batista de quem ele lhes falava", Elias e João têm de ser a mesma pessoa... Ora, todos conheciam a história do nascimento de João - aliás, o anjo que aparece a Zacarias diz que o menino "irá adiante do Senhor no espírito e no poder de Elias (Lucas, 1. 17)".

Sendo assim, a única possibilidade real de Elias ter retornado à terra como João era a de que ele reencarnou como João, conhecido como O Batista, primo de Jesus... Esta idéia na reencarnação, conhecida ao tempo e na região de Jesus com o nome confuso de ressurreição (Mateus, 16.13-15), era familiar a inúmeros sistemas filosóficos da era helenística, e é encontrado em Pitágoras, Sócrates e Platão, sendo retomado por Amônio Sacas e por seu discípulo Plotino e, já na era cristã, por Orígenes de Alexandria, um dos pais da Igreja. Esta crença permaneceu mais ou menos atuante durante os primeiros séculos do cristianismo até que os interesses temporais e políticos a tornaram numa crença herética. Cristo também solapou a proibição de Moisés de não invocar os mortos, pois sabemos de seu encontro visível com dois mortos (Mateus, 17. 14-21; Lucas 9. 37-43) - o próprio Moisés, e Elias (João já havia sido degolado a esta época) -, no fenômeno da transfiguração, isso sem falar nas aparições póstumas durante os quarenta dias após a crucificação, já que Cristo podia aparecer e desaparecer de repente, tanto em Emaús ("então se lhes abriram os olhos, e o reconheceram; mas ele desapareceu da presença deles." Lucas, 24, 31), como em Jerusalém "estando as portas fechadas" ("Ao cair da tarde daquele dia, o primeiro da semana, estando trancadas as portas da casa onde estavam os discípulos com medo dos judeus, veio Jesus, pôs-se no meio e disse-lhes: Paz seja convosco! João, 20, 19; "Finalmente apareceu Jesus aos onze, quando estavam em casa..." Marcos, 16,14). Tal fenômeno se explica perfeitamente pelo processo da materialização do nobre e poderoso espírito de Jesus. É interessante notar, nesse ponto, o comportamento de algumas seitas de base fundamentalista que aceitam tudo ao pé da letra que está escrito na Bíblia mas, quando chegam nestas partes dos Evangelhos, INTERPRETAM o que está escrito da forma que mais lhes convenha para negar a realidade destes fatos, isso quando não invocam o suposto ser que acaba por se transformar em seu maior aliado em questões que os embaraçam, ou seja, o "demônio", para dizer que estão errados os outros, os que aceitam a reencarnação ou a vida após a morte e que estão possuídos do espírito do mal, e não eles, detentores de todo o saber sobre o absoluto.... "Ai de vós, doutores da lei..." pois estão plenos de orgulho, e são como "Cegos a guiar outros cegos".

Enfim, ainda citando Mitchell, Jesus foi o maior exemplo de quão longe pode o homem chegar. Ele soube viver plenamente entre os dois mundos: o material e o espiritual. Soube dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus. Ele foi uma árvore. Como fala Mitchell, a árvore não tenta arrancar da terra as suas raízes e plantar-se no céu, nem tampouco estende suas folhas para baixo, junto à lama. Ela precisa tanto do solo quanto da luz, e sabe a direção de cada coisa. Exatamente porque enterra as suas raízes na terra escura, é que pode sustentar suas folhas no alto para receber a luz do sol... É pena que Jesus de Nazaré seja freqüentemente incompreendido pelos Cristãos.