"Por que permite Deus que os Espíritos nos induzam ao mal?
As Escolas de Aprendizagem do Evangelho no Processo psicoterapêutico. - Os Espíritos imperfeitos são instrumentos destinados a experimentar a fé e a constância dos homens na prática do bem. Como Espírito, deves progredir na ciência do infinito, razão porque passas pelas provas do mal, a fim de chegares ao bem. Nossa missão é a de colocar-te no bom caminho e, quando más influências agem sobre ti, é que as atrais, pelo desejo do mal.
Os Espíritos inferiores vêm em teu auxílio no mal, sempre que desejas cometê-lo; e só te podem ajudar no mal quando queres o mal. Então, se te inclinares para o assassínio, terás uma nuvem de Espíritos que te alimentarão esse pendor. Entretanto, terás outros que procurarão influenciar-te para o bem. Assim se restabelece o equilíbrio e ficas senhor de ti mesmo."
"É assim que Deus deixa à nossa consciência a escolha da via que devemos seguir e a liberdade de ceder a esta ou àquela das influências contrárias que nos solicitam." (Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. Capítulo IX. Intervenção dos Espíritos no Mundo Corpóreo. Pergunta 466.)
A modificação da personalidade e do comportamento humano, segundo o psicólogo Cari R. Rogers, segue um processo contínuo de mudança. Ele chama a isso o processo de tornar-se pessoa (Cari R. Rogers. Tornar-se Pessoa. 3a Parte. O Processo de nos Tornarmos Pessoa), e enumera sete fases sucessivas do processo, que vai da fixidez da personalidade para a fluidez, a movimentação interior, em relação a si mesmo.
É realmente preocupante para todos nós conhecer o que pode levar uma criatura a mudar de comportamento, e como isso acontece. De que forma e por quais meios podemos colaborar mais eficazmente para despertar em nós o desejo de melhorar? Quais argumentos convincentes poderiam tocar os nossos interesses, voltando-nos para a realização da reforma íntima?
Os interesses nos aspectos básicos de nossa vida, isto é, na satisfação das necessidades de subsistência, de conforto, segurança, bem-estar, procriação, dificilmente nos motivariam a ser mais dóceis na nossa maneira de ser, ou dividirmos o nosso prato com alguém faminto a nos bater à porta.
Quando já não nos satisfazemos com as coisas básicas e aspiramos a alguns valores espirituais, como cultivar uma arte, ampliar o conhecimento sobre alguma área do saber, ter um bom desempenho profissional, realizar algo proveitoso, dirigimos, ainda assim, o nosso esforço numa atividade que não necessariamente a de sermos melhores interiormente.
No entanto, quando ansiedades e conflitos indecifráveis, no sofrimento ou nos desajustes vividos, nos atormentam de alguma forma, buscamos correndo algo que nos liberte daquele estado, e não raro buscamos os recursos religiosos. Quase sempre achamos que o motivo está fora de nós, numa causa estranha, numa "influência espiritual". O Espiritismo tem contribuído frequentemente para solucionar esses problemas da esfera psicológica do comportamento individual.
Uma entrevista com alguém pronto para ajudar, que ouve-nos pacientemente os problemas, e daí somos encaminhados para um tratamento espiritual, o "passe", como mais comumente acontece. Antecedendo ao "passe", uma explanação evangélica, o ambiente é acolhedor, e dependendo da nossa condição os efeitos obtidos são mais ou menos profundos.
Caso estejamos suficientemente interessados e assim motivados de alguma forma, prosseguimos após a série de passes, quando então alguém nos diz: "O amigo já teve alta, precisa agora fazer a sua parte; não quer começar num Grupo de Estudo, ingressar numa Escola de Aprendizes do Evangelho? Deve cuidar da sua Reforma Intima..." A essa altura pouco percebeu que os seus males são frutos do seu próprio comportamento, dependem de si mesmo e para deles libertar-se precisa mudar interiormente. Os interessados, desse modo, estão também na categoria de "pacientes" e podem ser mesmo muitos dos que recorrem aos consultórios de psicólogos e psicoterapeutas, quando em condições de pagar os tratamentos.
O Dr. Rogers, no entanto, na sua pesquisa, preocupou-se em conhecer os fatores que intervêm na modificação da personalidade e do comportamento. O que existe de comum nessas alterações individuais, e qual o processo em que essas modificações ocorrem. Considera o psicólogo, de início, que, à semelhança do mecanismo de crescimento das plantas, onde as condições extrínsecas de temperatura, de umidade e de iluminação devem ser mantidas, igualmente deve-se estabelecer um conjunto de condições básicas e constantes de modo a facilitar o desabrochar e as metamorfoses que progressivamente se desenvolvem na personalidade dos pacientes.
Sejam quais forem os seus sentimentos: temor, desespero, insegurança, angústia, seja qual for o seu modo de expressão: silêncio, gestos, lágrimas ou palavras, deve o terapeuta manter e transmitir sua compreensão e aceitação do paciente tal como ele é. Acredita o Dr. Rogers que o processo como um contínuo vai de um estado íntimo de rigidez, de bloqueio, para o de mudança, pela conscientização das manifestações interiores, até o estado de aceitação pessoal dos sentimentos em transformação e chegando finalmente a uma confiança sólida na sua própria evolução.
O objetivo precípuo da Doutrina dos Espíritos é efetivamente a Reforma Intima, a modificação da criatura, do seu comportamento interior e exterior, conduzindo-a progressivamente à vivência dos ensinamentos evangélicos, na sua pureza original à luz da Terceira Revelação. A aceitação das criaturas não é condicionada a raça, cor, filosofia, credo religioso, ou político; são aceitas como elas são; o importante é que se disponham a se modificar nas diretrizes ensinadas e exemplificadas pelo Mestre Jesus.
Pode-se analogamente considerar, no Espiritismo, que os indivíduos passam por um processo de renovação dentro de uma continuidade, onde três fases intermediárias e sucessivas têm lugar: a dor ou inquietação, o esclarecimento consolador e a redenção pelo próprio esforço. No encaminhamento natural das pessoas que buscam o Espiritismo, na sua grande maioria trazida pela dor, os Centros Espíritas se constituem nos consultórios-escolas, que transmitem o tratamento psicoterápico-evangélico, acrescido do componente energético-espiritual, concretizado no apoio do Plano Espiritual, que age sobre as potencialidades do espírito e as estruturas sutis do perispírito, auxiliando na renovação integral das criaturas assim dispostas.
As ações combinadas das entidades espirituais e dos recursos dinâmicos do espírito, despertados nas criaturas, promovem as transformações íntimas dentro desse processo contínuo de conscientização de nós mesmos num sentido evolutivo-cristão. As sete fases do Dr. Cari R. Rogers têm as características abaixo indicadas, que traduzem o estado íntimo dos pacientes com problemas de comportamento, de relacionamento e de conduta. Primeira Fase: O indivíduo apresenta-se totalmente bloqueado intimamente. Recusa a comunicação sobre os assuntos pessoais.
Não tem consciência dos problemas pessoais. Não existe desejo de mudança. Tende a ver-se como não tendo problemas, ou os problemas que reconhece são entendidos como inteiramente exteriores a si mesmo. Ele é intimamente fixo, em oposição a qualquer mudança.
Segunda Fase: A comunicação começa a ser mais fluente em relação a assuntos não-pessoais. Os problemas sâo ainda admitidos como exteriores ao próprio indivíduo. Os sentimentos podem ser exteriorizados, mas não são reconhecidos como tais, nem atribuídos ao próprio indivíduo. Não existe o sentimento de responsabilidade em relação aos seus problemas.
Terceira Fase: Há um fluir mais livre da expressão sobre si como um objeto. O paciente exprime e descreve os sentimentos e as opiniões pessoais que não são as atuais, como se as mesmas pertencessem ao seu passado. Há uma aceitação muito reduzida dos sentimentos e a maioria deles é revelada como coisa vergonhosa, má, anormal ou qualquer outra forma de não-aceitação.
Quarta Fase: O paciente descreve sentimentos mais intensos, como se fossem do seu passado. Os sentimentos são descritos como objetos do presente, e muitas vezes surgem como que contra os desejos do paciente. Há pouca abertura na aceitação dos sentimentos, embora já se manifeste alguma. O indivíduo toma consciência da sua responsabilidade perante os problemas pessoais, mas com certa hesitação.
Quinta Fase: Os sentimentos são expressos livremente como se fossem experimentados no presente. O indivíduo aceita cada vez com maior facilidade a sua própria responsabilidade perante os problemas que tem de enfrentar. O diálogo interior torna-se mais livre, melhora a comunicação interna e reduz-se o seu bloqueio.
Sexta Fase: Os sentimentos são experimentados, agora, de um modo imediato, e são aceitos desaparecendo a hesitação ou a negação dos mesmos. A comunicação interior é livre e relativamente pouco bloqueada. Nesta fase já não há "problemas" exteriores ou interiores.
O paciente está a viver subjetivamente uma fase de seus problemas.
Sétima Fase: Há um sentido crescente e continuado de aceitação pessoal dos sentimentos em mudança e uma confiança sólida na sua própria evolução. A comunicação interior é clara. Há a experiência de uma efetiva escolha de novas maneiras de ser. Estas fases apresentam-se bem nítidas nos pacientes que chegam aos consultórios com problemas psicológicos, e são então conduzidos a se libertarem dos mesmos iniciando-se pela aceitação deles e da tolerância para com eles, compreendendo-os como naturais e passíveis de serem modificados.
Este não é igualmente o processo pelo qual despertamos para o sentido maior da nossa existência? O sofrimento e a dor não são os efeitos da não-aceitação das condições em que vivemos? Tudo não se passa realmente no nosso campo psicológico?O conhecimento espírita conduz precisamente os indivíduos a realizarem o trabalho de auto-análise incentivando-os à auto-educação, num processo contínuo de conscientização e reforma, com um significado mais profundo, tendo como meta a vivência evangélica.
Nas Escolas de Aprendizes do Evangelho, citadas no capítulo anterior, ocorre aos seus iniciantes a passagem de uma fase a outra, no transcorrer do seu desenvolvimento, exatamente dentro desse mesmo processo de conhecimento e mudança interior. Seguindo pari passu, temos constatado o crescimento dos integrantes, como segue:
Primeira Etapa: Reflete bem o estado íntimo daqueles que chegam ao Centro Espírita em busca de algo que amenize a sua angústia, a sua dor, a sua inquietação, sem, no entanto, nada quererem fazer em seu próprio benefício. Ao serem encaminhados para ingressar na EAE, estão ainda fechados dentro de si mesmos, rígidos, sem compreenderem o mundo de sentimentos e pensamentos que tumultuam o seu espírito.
Segunda Etapa: Após verificar a abordagem compreensiva dos dirigentes da EAE sobre os problemas comuns a todos, sentem-se mais tranquilos, como que acariciados no seu coração, e vão se descontraindo, se familiarizando, se adaptando ao grupo da turma.
Terceira Etapa: Tornam-se mais desinibidos, mais identificados com os companheiros de turma. Nas oportunidades de apresentação dos temas dados em aula, as dificuldades de desenvolver os assuntos ainda são observadas. Sentem-se bem no ambiente e já se esforçam por assistir às aulas.
Quarta Etapa: Os lampejos de consciência começam a surgir, os momentos de reflexão sobre o próprio comportamento, por vezes, aparecem. Nota-se uma nova disposição, embora não totalmente definida, em transformar-se interiormente. É visível o aumento de interesse na EAE. Algo, no aprendiz, começa a ser identificado no seu mundo interior. As primeiras alegrias, embora recônditas, são vividas.
Quinta Etapa: Desaparecem os receios, amplia-se a confiança em si mesmo, projetam-se os ideais de servir a Jesus, a compreensão e o próprio trabalho de Reforma Intima se acentuam. A caderneta que a EAE adota para registrar as auto-avaliações periódicas é agora utilizada com mais frequência. Tornam-se mais livres e desembaraçados dos sentimentos mesquinhos e indefinidos que antes lhes envolviam. Aceitam comentar e poderão até citar alguns defeitos que já reconhecem neles próprios.
Sexta Etapa: A participação na EAE está definida. O estágio de servidor é alcançado: O combate aos vícios já apresenta conquistas e a vigüância aos defeitos se efetua intimamente. O entendimento deles para com o próximo se apresenta mais tolerante, paciente, o que reflete a disposição íntima para com eles próprios, agora completamente flexíveis e muito mais compreensivos. A vontade de algo realizar e de se dar num serviço ao próximo já foi praticada e os seus benéficos efeitos foram experimentados.
Sétima Etapa: O servidor aproxima-se da passagem para o estágio final de discípulo. Algo de muito sólido realmente já foi alicerçado no seu espírito. O desejo de ser cada dia melhor é mais intenso. O trabalho em modificar-se é feito espontaneamente e o conhecimento deles mesmos chegou a um bom nível. Sentem e testemunham no trabalho doutrinário o seu ideal de servir a Jesus. Momentos de grande elevação espiritual são experimentados. Estão em condições de caminhar resolutamente na senda escolhida.
Esse processo de mudança interior, que pode mais facilmente se realizar num grupo, como foi mencionado, colocando a importante contribuição da EAE, ocorre também, constantemente, de forma isolada, entre os que compreendem as finalidades da Doutrina dos Espíritos e, iniciando-se pela leitura dos livros básicos da Codificação, começam a confrontar-se com os conhecimentos adquiridos.
É também o próprio caminho de auto-conscientização, da nossa natureza íntima, espiritual, e da destinação infinita, eterna, que inexoravelmente avançamos num processo incessante de percepções, de mutações, adequando-nos às leis da evolução que regem o Universo. Diríamos mesmo que a evolução se realiza por todos os meios e assim nos proporciona a Sabedoria da Criação, mas resta-nos conduzir nossos interesses nessa direção, compatibilizando-nos com aquelas leis de evolução, impulsionando-nos deliberadamente à realização das mutações íntimas num sentido cristão, evangélico. Esse é o Processo de Mudança Interior que o Espiritismo nos apresenta.
Ney Prieto Peres
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