Por mais de uma feita procurei, em rapaz, desviar-me das diretrizes traçadas por Deus, por onde palmilharia eu na senda do progresso, da evolução espiritual. É que forças subjugadoras induziam-me ao mau caminho; faziam-me divisar horizontes nebulosos, e, vencido pelo desânimo, achava lógico, razoável mesmo, sair da vida material pela porta escusa do rompimento voluntário dos liames que uniam o meu espírito, enfraquecido pela falta de oração, a um corpo esgotado pelo nervosismo doentio, causado pelo apego aos bens da Terra.
Justamente por isso, em vão esgotava-me por conseguir tranqüilidade material. Minhas lembranças pretéritas eram reavivadas, maldosamente, pelos que me sabiam inseguro de mim mesmo e, sempre que ocasiões oportunas vislumbravam reacendiam em mim a chama do amor ao fausto, à intemperança, à vida regalada dos antigos senhores feudais ...
Conferindo-me direitos que eu próprio não tinha, gostava de censurar o meu próximo - encontrar o argueiro do olho de meu vizinho, esquecido da trave que permanecia no meu próprio. Por isto, por falta ao cumprimento conceito do Cristo "não julgueis para não serdes julgados", da mesma forma era eu também, submetido às severas críticas de entidades espirituais que, também como eu, sabiam descobrir faltas alheias, mas eles próprios andavam braços dados ao erro.
Deveria eu estar atento, sim, muito atento à minha reforma espiritual; deveria eu vigiar e sondar o meu coração. Por estas razões, pela falta de caridade cristã, irmã da fé e filha do amor, deixava-me levar pelas induções dos que permanecem nas trevas.
Concluireis: "Foste, então, um médium, que andou à falcatrua. Sofreste perseguições, tais, que nos causam receio até em supormos situações semelhantes aplicadas a qualquer um de nós, porquanto temos, também, as nossas faltas!"
Realmente; em geral, os médiuns ferem os pés nos espinhos das urzes do caminho que os leva à mediunidade. Entretanto, iluminados pelo exemplo grandioso do Cristo, compreendemos que cada um de nós deve tomar de sua cruz e segui-lo. Jesus exemplificou-nos pelo Calvário a verdade de que o merecimento do bom filho é cumprir a vontade do Pai. E não foi o nosso Pai quem nos conferiu a mediunidade? Nós a recebemos como graça, para a depuração, para a elevação de nosso espírito e para o cumprimento da lei do amor a Deus e ao próximo?
Em torno de um médium, há condensações de fluidos que constituem sua aura de atração poderosa sobre os que, libertos do corpo, possuem vibrações afins. Assim, não perseverando no bem, não desejando tornar-se fiel intermediário dos mensageiros da Boa Nova, torna-se o médium um poderoso ímã às vibrações dos que são contrários à difusão da luz eterna.
Portanto, estava em meu livre-arbítrio evitar os tormentos, aos quais, em geral, me submetia pela minha servidão à negligência espiritual.
Sofria e fazia que sofressem comigo. Exasperava-me; era descuidoso no trato com os que me criaram no coração profundas raizes do afeto. Depois, com dificuldade, era que condenava os fatos ocorridos. Dificilmente compreendia como chegara a exteriorizar sentimentos que, positivamente, não eram meus.
Tinha verdadeira repulsa pelos que menosprezavam os humildes, pelos que se ufanavam de suas posses materiais. No entanto, por vezes, sentia-me orgulhoso, descaridoso para com os menos favorecidos materialmente, mal grado meu. Reconditamente, tramava grandes embates de sentimentos e, por vezes, chegando à vitória sobre o mal, orava sentidamente à Maria de Nazaré. Ah! irmãos, grande consolo encontrei sempre, como encontro hoje, no amor puríssimo de Maria! As penas que me afligiam encontravam termo, e grande paz inundava meu ser. Sentia-me feliz, satisfeito por haver encontrado tranqüilidade de espírito.
Quando estas situações aflitivas me dominavam, embalde procurava concentrar o pensamento em estudos, em uma atividade qualquer. Tomado de angustiosa agitação, necessidade havia de buscar, cheio de ansiedade, auxílio na proteção do Alto. Graças ao Senhor, minhas súplicas jamais foram desatendidas! Miserável, nada merecendo de meus guias tutelares, entretanto, era sempre solicitamente amparado, tão logo orasse, tomado de fervoroso sentimento de perdão. Quantas e quantas vezes roguei perdão, por ter ouvidos de ouvir e fazer-me de surdo. Porém, ai de mim, o coração, enfraquecido pela invigilância, não perseverava no bom caminho. Perseverar no bem é chave miraculosa que nos abre, de par em par, a porta da mansão da paz e da bem-aventurança.
Sempre que tiverdes que trabalhar, médiuns, obreiros da seara de Jesus, não vos descureis de, como preparação indispensável, sine qua non, robustecer-vos pela prece vibrante, sincera, prece esta que vos colocará sob proteção de vossos guias, de entidades amoráveis, de espíritos benfeitores.
Quão difícil é o vosso encargo, qual seja, o de comungardes, pelos eflúvios de vossos corações, com os eflúvios emanados das entidades superiores, se para tal não vos orientais pelos conceitos do Cristo! E quão responsável é o médium que se apresta ao labor santificante, o de vos reunirdes, em nome de Jesus, para o trabalho espiritual, sem um acurado exame introspectivo, a fim de agir segundo o Evangelho citado por Mateus, cap.V: 23 e 24, que recomenda não nos dirijamos ao Senhor sem que antes nos tenhamos reconciliado com os nossos inimigos.
Se agasalhais o espinho ferino da inimizade e perdoais o vosso irmão, sois bom espírita. Se vos entregais, por comprazimento, a inveja, à calúnia, não sois dignos de servirdes ao Cristo. Lavai-vos, purificai-vos, primeiramente, pela oração sincera, pela extirpação de vossos defeitos, que são percalços na tarefa a que vos dedicais. Quantos erros cometem os homens por serem perseverantes no mal?!
Não é do meu intuito apresentar-me com a autoridade de pregador, ou de orientador que para tanto não possuo virtudes nem cabedal. Falo-vos, tão-somente, como um amigo irmão. Qual irmão que, tendo passado da vida material para a espiritual, transposto o Rubicão segundo os que encaram a morte sob um prisma sombrio, sente atração poderosa por concitar seus demais irmãos ao bem, tendo ele próprio experiências mais amplas, colhidas no além-túmulo. Seriam estas experiências utilizadas com proveito pelos que ficaram no jugo da carne? Um só pensamento impele-me a traduzir-vos o que me vai n'alma - o da prática do bem. Desejo-vos o bem futuro, médiuns. Desejo possais colher aqui flores e mais flores que vos transportem de júbilo.
Penosamente arrastava-me, assim posso exprimir-me, todas as vezes que caminhava rumo ao centro espírita, ao núcleo de nossas reuniões espirituais. Sentia-me, a contragosto, e crivado de defeitos, visivelmente contrariado comigo mesmo em não estar de conformidade com o preparo espiritual que deveria ter. Sentia-me inclinado a retroceder em meus passos, já que tão merecedor de censuras de meus guias espirituais eu me achava.
Qual um mau aluno, ante um mestre enérgico e consciencioso, eu queria sempre evitar uma aproximação maior com os esclarecidos espíritos, dos quais recebia orientações sábias, todas as vezes em que chegava ao grupo espírita a que pertencia, apresentando-me densamennte carregado de fluidos pesados. Meus confrades lembram-se, quem sabe, com piedade, da pessoa daquele médium retardatário ou, quando não, faltoso! É que não vigiava com o espírito alerta pelas diretrizes bem definidas na moral dos Evangelhos de Jesus, como o médium deve desempenhar-se de suas tarefas, sob as bênçãos do Altíssimo.
Não foi sem dificuldades que me aprestei ao labor. Havia já colhido experiência amargas da vida. Com o coração mais espiritualizado pela dor, pelo sofrimento, fui compreendendo, sentindo, quão bela é a Doutrina de Jesus e quão preciosa é a luz que nos vem da Terceira Revelação. Instado por terceiros, levado pelo desejo de fazer alguma coisa em benefício de meu próximo, interessei-me em trabalhar como médium, principalmente, para esclarecer os espíritos das trevas e perdoar meus inimigos. Entretanto, se bem decidi, bem não soube firmar a minha decisão no serviço da caridade. Freqüentemente, deixava-me em empolgar pelo desânimo; dava ouvido as más sugestões; subestimava o valor do meu concurso na tarefa, tanto assim que dizia a meus confrades: Talvez seja melhor que vocês arranjem outro médium. Eu não dou boa conta! ... "
Meus companheiros, bondosamente, sorriam, pilheriavam e, com pulso firme, não permitiam que eu me furtasse ao cumprimento do sagrado dever. Nem sempre há oportunidades favoráveis ao desenvolvimento da mediunidade, mormente quando o médium, desconhecendo os princípios básicos da moral cristã, não pauta sua conduta dentro de um padrão elevado. Quanto mais ignorante das palavras do Cristo, mais difícil se torna o desenvolvimento da mediunidade a serviço fraterno entre os espíritos. A base em que se deve assentar a mediunidade, quando o indivíduo deseja fazer despertar em si os dons magnéticos em prol da causa espírita cristã, deve ser o Evangelho do Cristo. Primeiramente, guardar em seu coração os ensinos de nosso Mestre, procurando banhar-se nas águas límpidas das verdades divinas, purificar-se por uma diretriz cristã e pura. Só depois, então, poderá dispor-se à tarefa. Assim deveria ser, porquanto antes de nos sentarmos à mesa do banquete, é necessário tenhamos as mãos lavadas.
Jesus nos falou, assim, diversas vezes, por parábolas. Ele foi e é contra as práticas exteriores. Estejamos certos de que o bom cristão não imita os fariseus, purificando-se apenas exteriormente. Jesus advertiu-nos da necessidade de termos lavadas as mãos antes do banquete - banquete da vida eterna - simbolizando que devemos ter o espírito elevado pela oração ao Pai, lavada a nossa alma pelo desejo de regeneração própria, a fim de partilharmos deste banquete -- espiritual. O médium mal preparado ficará sujeito as tentações, das quais não saberá fugir, as sugestões malsãs e, até mesmo, sujeito a ser veiculo de falsos profetas.
Não será falta de médiuns que dificultará a divulgação da Boa Nova. Pelo contrário, médiuns pouco avisados, mal iniciados, servirão de pedras de escândalo, causarão danos a si próprios e à propagação da Doutrina. É muito grave o passo dado por aquele que, admirando o esplendor da luz, se esquece de conservar em si mesmo o brilho de uma luz interior, que se chama "cumprimento do dever perante Jesus' É muito grave dizer: "Sou médium", "Sou espírita", e servir de ponto de discórdia, veículo de simulacros, repasto as observações malsãs. Nos evangelhos existem ensinos vários a vos alertar contra o mau servo. Sejamos dos que, tendo recebido um denário, fizeram jus ao quinhão recebido do Senhor.
Estas advertências, já vos disse e torno a frisar, partem de um coração que, se vive, é por uma única razão, pela bondade infinita de Deus.
E, em louvor, em gratidão às bênçãos recebidas, desejo repartir convosco o pão que ora recebo - verdades que, as conhecendo, releguei ao descaso pela minha invigilância, verdades sem as quais não podereis caminhar, médiuns, triunfalmente para a vitória. Qual é esta vitória? A de vencerdes o mal, pelo bem; a de perdoardes, sendo espezinhados; a de sorrirdes felizes, sendo perseguidos; a de vibrardes bem alto a corda sensível do vosso coração, em amor a Deus, que vos da a graça da vida terrena como resgate de vossas dívidas.
Ah! Quantas recordações penosas me dilaceram a alma, que em queixumes lamenta: "-Jesus, perdão, por não haver compreendido, o sentido e exemplificado a tua grandiosa Doutrina! Tu que já me perdoaste setenta vezes sete, perdoa-me, Jesus, ainda mais uma vez!
E célere, rápido como um pensamento de amor, penso em vós, irmãos em Cristo, nos percalços que vos cercam, nas urzes que se antepõem à vossa jornada e, tomado de fraternal carinho, elevo o meu pensamento em prece, rogando ao divino pastor o seu amparo para todos vós. Irmãos, divisai sempre a luz brilhante da verdade! Não vos percais por ínvios caminhos.
Pedro Richard Filho
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