sábado, 19 de março de 2011

Da primeira Sociedade aos centos Espíritas da Atualidade

ANTONIO CESAR PERRI DE CARVALHO

Após o lançamento de O Livro dos Espíritos foi intenso o interesse pela Doutrina nascente. Allan Kardec foi muito procurado por aqueles que queriam conhecê-lo pessoalmente e com ele trocar idéias.

O Codificador já realizava reuniões às terças-feiras, há seis meses, em sua residência, na rua dos Mártires, 8, em Paris. No início, ali compareciam de 8 a 10 pessoas, chegando, às vezes, até 30, movidas pelo desejo de conhecer o Espiritismo e o próprio Kardec. Este e seus companheiros chegaram à conclusão de que deveriam organizar uma sociedade, o que se efetivou com a fundação, em 1º. de abril de 1858, da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas (SPEE), que começou a funcionar na galeria de Valois, no Palais-Royal. Um ano depois e até 1º. de abril de 1860 a SPEE realizou suas sessões numa outra ala do mesmo edifício, em salão do restaurante Douix, na galeria Montpensier. A partir desta última data, a Sociedade passou a funcionar em sede própria, na passagem Sainte-Anne, na rua Sainte-Anne, 59. Allan Kardec divulgou muitas informações sobre a SPEE nas páginas da Revista Espírita, adaptando-as depois, em forma de orientações para reuniões, em capítulos de O Livro dos Médiuns, onde também transcreve o “Regulamento da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas”.

A SPEE foi um autêntico laboratório, viabilizando a experiência com atividades espíritas valiosas para o Codificador e, sem dúvida, ponto de referência para os interessados na novel Doutrina Espírita.

Quase no final de sua jornada física, inclui na Revista Espírita interessante matéria intitulada “Estatística do Espiritismo”. O Codificador destaca que “do ponto de vista da difusão das idéias espíritas, e da facilidade com que são aceitas, os principais Estados da Europa podem ser classificados como se segue: 1º. França. – 2º. Itália. – 3º. Espanha. – 4º. Rússia. – 5º. Alemanha. [...]” (destacamos os cinco primeiros). Kardec realiza o primeiro estudo sobre a “proporção relativa dos espíritas”, analisando vários fatores e as categorias em que “[...]o Espiritismo encontrou, até hoje, mais aderentes”.

O trabalho de difusão das idéias espíritas também se concretizou com as viagens feitas pelo Codificador à França e Bélgica, dirigindo-se, entre outros, aos espíritas de Lyon, Bordeaux, Tours, Antuérpia e Bruxelas.

Léon Denis, que conheceu Kardec durante visita deste a Tours, em 1862, e depois esteve com ele em mais duas oportunidades no ano de 1867, veio a se transformar no grande divulgador do Espiritismo e consolidador do Movimento Espírita francês, visitando inúmeros grupos espíritas e neles fazendo palestras. O Espiritismo se firmou em várias localidades francesas. Léon Denis considerou que “Lyon é a muralha do Espiritismo”. Esta cidade chegou a possuir uma creche espírita fundada em 1903.

Ao chegar em nosso país, a nascente Doutrina encontrou abrigo inicial na primeira instituição – o “Grupo Familiar do Espiritismo” (Salvador, 1865) – e depois na cidade do Rio de Janeiro com o Grupo Confúcio (1873), a Sociedade de Estudos Espíritas “Deus, Cristo e Caridade” (1876), o Grupo Espírita Fraternidade (1880), o Grupo Ismael (1880) e a própria Federação Espírita Brasileira (1884). Seguiram-se fundações de grupos espíritas em vários Estados do País e trabalhos pioneiros como os de Antônio Gonçalves da Silva (Batuíra), Anália Franco, Eurípedes Barsanulfo, Cairbar Schutel, entre outros.

Durante as comemorações do Primeiro Centenário de Nascimento de Allan Kardec, promovidas pela FEB, no Rio de Janeiro, de 3 a 5 de outubro de 1904, com a participação de representantes de várias instituições espíritas do Brasil, foi aprovado o documento “Bases de Organização Espírita”, primeira orientação voltada à criação de associações espíritas nas capitais de todos os Estados, para o estudo e a propagação da Doutrina, e a união de todos os núcleos.

Nas primeiras décadas do século XX, graças à árdua dedicação de pioneiros, que difundiriam a Doutrina, concretizando ações sociais, de certa forma inspirados na experiência do trabalho da “Assistência aos Necessitados” da FEB, o Movimento Espírita se desenvolveu e conquistou espaços junto à população e o respeito de autoridades governamentais.

Esses traços iniciais das instituições espíritas do Brasil foram identificados inclusive por estrangeiros. No ano de 1941, Gabriel Gobron anotou em Le Fraterniste, após visitar nosso país: “[...] à frente do mundo no tocante à organização espírita de assistência pública vem o Brasil. Não há Centros Espíritas que não tenham ou cuidem de ter uma assistência aos necessitados. O Espiritismo brasileiro é a caridade em ação [...] e o Brasil e seus espíritas são pobres!”.

Em meados do século XX, as obras psicográficas e o trabalho de Francisco Cândido Xavier provocaram impacto significativo na consolidação e na expansão do Movimento Espírita brasileiro. Tal fato se intensificou a partir dos anos 1960, com a presença do referido médium na televisão.

A essa altura, já existiam propostas de incentivo ao estudo e aos cursos de Espiritismo, alimentadas principalmente pelas então chamadas Mocidades Espíritas, notadamente em eventos regionais, estaduais e nacional, como foi a I Confraternização de Mocidades e Juventudes Espíritas do Brasil (Marília, SP, 1965). Experiências pioneiras de cursos eram levadas a efeito por instituições de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Paraná. Importante reforço surgiu em 1983, com a aprovação pelo Conselho Federativo Nacional da FEB da “Campanha do Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita”.

A tendência de aumentar-se a procura pelos centros espíritas, a partir dos “Pinga-Fogos” na TV, com Chico Xavier, gerou a preocupação sobre algumas aparentes distorções e obstáculos à organização doutrinária dos centros: ações de assistência social apenas com a materialização da caridade e a mediunidade como fim, poderiam comprometer as bases do Movimento Espírita. Seria importante o fortalecimento em bases kardequianas e a divulgação pelo livro.

A União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo (USE) produziu significativos instrumentos de difusão e orientação, tais como a “Campanha Comece pelo Começo” e a “Carta aos Centros Espíritas”.

No final dos anos 1970, as Entidades Federativas Estaduais, que integram o Conselho Federativo Nacional da FEB, aprovaram o texto “A adequação do Centro Espírita para o melhor atendimento de suas finalidades” na Reunião de 1º. a 3 de outubro de 1977, com base nas Conclusões dos Conselhos Zonais. (out./1975 a abr./1977). Em seguida, numa continuidade de aprofundamento de estudos ao longo de suas Reuniões Zonais (1978-1979), e na sua Reunião Plenária, em julho de 1980, o CFN aprovou o texto “Orientação ao Centro Espírita”, que passou a ser um marcante subsídio orientador para as instituições espíritas do País.

Depois de quase três décadas, o referido documento foi reanalisado com base em sugestões apresentadas pelas Entidades Federativas Estaduais, discutido em Comissões Regionais do CFN é, finalmente, aprovado um texto atualizado e ampliado na Reunião do CFN de 2006, sendo lançado por ocasião do 2º. Congresso Espírita Brasileiro. Desta maneira, “a título de sugestão e de subsídio, oferece orientações e material de apoio, elaborados e disponibilizados pelos órgãos federativos e de unificação do Movimento Espírita, para as atividades dos Centros e demais instituições espíritas, visando facilitar as tarefas de seus trabalhadores, no encaminhamento de assuntos doutrinários, administrativos, jurídicos e de unificação”.

Em nossos dias, o Movimento Espírita Brasileiro conta com mais de doze mil instituições em funcionamento. Cento e cinqüenta anos após a publicação de O Livro dos Espíritos e da fundação do primeiro Centro Espírita do mundo, há conquistas evidentes e, sem dúvida, grandes responsabilidades. De forma amadurecida e com elaboração coletiva, dispõe-se de oportunos materiais de orientação e de apoio à ação espírita.

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