Alexandre Fontes da Fonseca
Dallas – TX – EUA
Desde a publicação da 1ª edição de O Livro dos Espíritos (LE), a Ciência progrediu de modo significativo, beneficiando a humanidade de diversas formas. Os fundamentos básicos do Espiritismo, entretanto, permaneceram inalterados e atuais, não tendo sofrido em nada frente às novas descobertas da Ciência. As razões dessa firmeza científica da Doutrina Espírita já foram explicadas há mais de 10 anos em artigo publicado no Reformador, em 1994, pelo Prof. Silvio S. Chibeni . Em poucas palavras, a solidez do Espiritismo decorre do fato de que seus princípios fundamentais se encontram próximos do nível fenomênico, isto é, próximo dos fenômenos e fatos investigados por Allan Kardec.
Isso não nos exime do estudo constante e da análise das obras básicas do Espiritismo frente ao desenvolvimento das Ciências, conforme a recomendação mesma de Kardec de que “caminhando de par com o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas lhe demonstrassem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificaria nesse ponto.” (Item 55 do cap. I de A Gênese ).
Alguns companheiros, ainda que muito bem intencionados na busca pela verdade, acreditam que a resposta dada pelos Espíritos à questão 34 contém um erro científico que, conforme a recomendação de Kardec, deveria ser corrigido. Cumprindo um dever de esclarecimento, buscamos na própria Ciência, especificamente na Física Quântica, a chave para o entendimento das questões 34 e 34-a, mostrando ao leitor que elas estão corretas do ponto de vista do conhecimento científico atual, e que apenas houve engano na interpretação dos conceitos científicos. Transcreveremos as duas questões a seguir:
34. As moléculas têm forma determinada?
“Certamente as moléculas têm uma forma, mas que não podeis apreciar.”
34-a. Essa forma é constante ou variável?
“Constante para as moléculas elementares primitivas, mas variável para as moléculas secundárias, que não são mais que aglomerações das primeiras. Porque, o que chamais molécula ainda está longe da molécula elementar.”
O suposto erro da resposta à questão 34 decorreria de os Espíritos dizerem que não podemos apreciar a forma das moléculas. Segundo alguns companheiros, a Física e a Química já desenvolveram métodos experimentais para a visualização de moléculas e mesmo de átomos individuais. Citam-se os resultados de experimentos com os chamados microscópios de tunelamento e estudos teóricos sobre a geometria molecular como bases para concluir-se que as moléculas têm formas determinadas, contrariando a resposta dos Espíritos. O equívoco desta conclusão está justamente na interpretação dos resultados desses experimentos e dessas previsões teóricas.
O microscópio de tunelamento é um aparelho desenvolvido para estudar-se a superfície de materiais em escala atômica. Ele se baseia no fenômeno conhecido como tunelamento quântico, no qual elétrons da ponta do microscópio atravessam o vácuo entre a ponta e a superfície do material, em decorrência da probabilidade quântica de tal travessia ocorrer, e não por ter energia suficiente para isso. Assim, através da medição da corrente elétrica que flui através da ponta do microscópio, um programa de computador constrói, com base na teoria quântica, uma imagem artificial do que seria a densidade de elétrons dos átomos da superfície da amostra, na medida em que a ponta se move sobre ela. Portanto, a imagem que se vê não é uma imagem real dos átomos, mas sim um modelo criado pela Ciência para a compreensão dos fenômenos físicos em escala atômica.
A questão da forma das moléculas necessita uma análise cuidadosa. O conceito de forma está ligado à aparência, feição, configuração, o que é algo fácil de definir para um objeto macroscópico por causa da facilidade em delinearmos sua superfície. No caso de uma molécula, o que delimita a sua superfície? Suponha que a forma de uma molécula seja definida pela região do espaço ocupada pelos elétrons dos átomos dessa molécula, a chamada nuvem eletrônica. A teoria quântica prevê qual região do espaço é mais provável de se encontrar tais elétrons. Tal região poderia ser tomada, então, como sendo a forma mais provável da molécula, mas nunca a forma absoluta da mesma.
Quando a Ciência diz, por exemplo, que o benzeno tem a forma de um hexágono, ou que moléculas formadas por dois átomos são lineares, não está determinando com precisão a forma absoluta dessas moléculas. Essas são, apenas, algumas das propriedades e simetrias estruturais dessas moléculas. Por exemplo, no caso do benzeno, existe um fenômeno conhecido como ressonância entre duas formas possíveis para a estrutura eletrônica dessa molécula, pois não se pode determinar a priori onde alguns dos seus elétrons se localizam. Isso é um exemplo de indeterminação na forma do benzeno.
Com base nisso, analisemos agora a questão 34 do LE. Kardec pergunta se as moléculas têm forma determinada, isto é, bem definida. Os Espíritos dizem que as moléculas têm uma forma, mas que não podemos apreciá-la. Ter uma forma que não se pode apreciar ou medir com precisão é equivalente a dizer que as moléculas não possuem uma forma bem definida. Essa resposta está, portanto, em pleno acordo com o que a teoria quântica prevê para a forma das moléculas. Somos incapazes de apreciar de modo preciso a forma das moléculas por causa da natureza probabilística da teoria quântica. Por causa do princípio de incerteza de Heisenberg, jamais teremos total certeza sobre a posição dos elétrons de uma molécula e, conseqüentemente, da sua forma.
Kardec, para elucidar ainda mais a questão, propõe a pergunta 34-a sobre a variação na forma das moléculas. Daí os Espíritos dizem que as moléculas elementares possuem forma constante, e que as moléculas formadas por aglomerações maiores de átomos têm formas variadas. Tanto a teoria quântica quanto os experimentos realizados com moléculas diferentes e de tamanhos diversos, confirmam a existência de diversas conformações (formas espaciais) para moléculas formadas por muitos átomos, enquanto que pequenas moléculas tendem a possuir poucas configurações de equilíbrio. Os Espíritos também disseram que o que chamamos de molécula ainda está longe da molécula elementar, o que é confirmado pela Física de Partículas.
Por essa razão, a resposta dada pelos Espíritos às questões 34 e 34-a estão corretas e de acordo com o conhecimento científico atual. O leitor que tiver interesse em outras análises sobre as relações entre conceitos da Física, da Ciência e o Espiritismo, pode encontrá-las no conjunto de aulas sobre “Ciência e Espiritismo” publicadas nos boletins do GEAE entre os números 483 e 500.
Cabe aqui um comentário final. Não é à toa que alguns companheiros acreditaram que a resposta à questão 34 do LE estava errada. Se nos dias de hoje é difícil explicar numa linguagem acessível os conceitos sobre a estrutura da matéria decorrentes da teoria quântica, somos forçados a reconhecer (e admirar) a sabedoria dos Espíritos com a resposta dada à questão 34, pois, com bastante simplicidade, ela adianta em mais de 50 anos o que somente poderia ser compreendido após o desenvolvimento da teoria quântica.
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